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Se o Ministério Público pugna pela absolvição do réu em alegações finais, pode o juiz prolatar sentença penal condenatória - 11/12/2017
Se o Ministério Público pugna pela absolvição do réu em alegações finais, pode o juiz prolatar sentença penal condenatória (Art. 385 do CPP – Nos crimes de Ação pública, o juiz poderá proferir sentença condenatória, ainda que o Ministério Público tenha opinado pela absolvição, bem como reconhecer agravantes, embora nenhuma tenha sido alegada; Porém, a Constituição Federal Brasileira vigente assegura um processo penal pautado em direitos e garantias do acusado, de modo que disposição infraconstitucional que verse em sentido oposto, a ex. do Art. 385 do CPP, não há prevalecer. Simplesmente pelo fato de ser inimaginável que a CF/88 tenha recepcionado semelhante dispositivo, uma vez que tal recepção significaria manifesta violação de caros vetores constitucionais, notadamente o princípio do sistema processual penal acusatório; Nesse sentido, a preciosa lição de Vladimir Aras: “Faltando a acusação estatal (seja a inicial, correspondente à denúncia, ou a derradeira, a das alegações finais), não há como proferir decisão condenatória, sem que o juiz se transforme em parte no processo penal e autor da tese acusatória já abandonada pelo dominus litis.”; No mesmo passo, Paulo Queiroz: “Temos, porém, que esse dispositivo não foi recepcionado pela Constituição de 1988, a qual adotou, ainda que de modo sumário, o sistema acusatório de processo penal, que distingue, claramente, as funções de acusar, defender e julgar (actum trium personarum), razão pela qual compete ao Ministério Público, como regra, e ao ofendido, como exceção, promover a ação penal pública, na forma da lei.”; Na mesma trilha, Alexandre Morais da Rosa (2016, p. 481): “Anote-se que o Art. 385 do CPP não é compatível com o processo entre jogadores e constitucional. Logo, se o jogador acusador requerer a absolvição, a decisão do julgador estará vinculada aos limites do pedido em alegações finais, não podendo condenar, sob pena de trazer para si o objeto do processo.”; Outra não a lição da professora Ana Claúdia Pinho, no bojo das Razões de Apelação lançadas nos autos de Ação Penal, no exercício da 1ª Promotoria Criminal da Comarca de Ananindeua, Pará, em fevereiro de 2003: “Portanto, no momento em que o próprio Ministério Público retira a acusação (...), desaparece a pretensão acusatória, não cabendo ao juiz outra alternativa, senão absolver o réu. Afinal, se o próprio Ministério Público – que, por força constitucional, é a única Instituição que detém a titularidade da pretensão acusatória – não mais está acusando, não pode o juiz condenar, porque se assim o fizer, passará de órgão julgador a órgão acusador, o que é um verdadeiro e total absurdo.”; Por sua vez, em artigo de título ‘E por que, então, o juiz não pode condenar quando o Ministério Público pedir a absolvição?’, o professor Aury Lopes Jr. elabora a seguinte reflexão sobre o tema: “Se o acusador deixar de exercer a pretensão acusatória (pedindo a absolvição na manifestação final), cai por terra a possibilidade de o Estado-Juiz atuar o poder punitivo, sob pena de grave retrocesso a um sistema inquisitório, de juízes atuando de ofício, condenando sem acusação, rasgando o princípio da correlação e desprezando a importância e complexidade da imparcialidade.”; Assim sendo, o Ministério Público ao pronunciar-se de forma diversa ao pedido apresentado na exordial acusatória, manifestando, em sede de Alegações Finais, entendimento apontando dúvida invencível quanto à culpabilidade do réu, claramente transmuda-se o caráter da anterior pretensão acusatória para, já agora, uma pretensão absolutória; De igual modo ensinam, Karine Azevedo Egypto Rosa e Renata Moura Tupinambá: “Quando o MP, em alegações finais, pugna pela absolvição do réu, está, em verdade, formulando nova pretensão — aquele resultado que deseja ver concretizado ao final do processo. Em caso de pedido de absolvição pelo órgão acusador, o julgamento deve estar a ele vinculado.”; E tal visão é corroborada por ninguém menos do que o mestre processualista Frederico Marques, citado por Vladimir Aras: “A titularidade da pretensão punitiva pertence ao Estado, representado pelo Ministério Público, e não ao juiz, órgão estatal tão-somente incumbido da aplicação imparcial da lei para dirimir os conflitos entre o jus puniendi e a liberdade do réu. Não há, em nosso processo penal, a figura do juiz inquisitivo. Separadas estão, no Direito pátrio, a função de acusar e a função jurisdicional.”; Elmir Duclerc (2008, p. 128): “Além de alguns dispositivos do CPP (como os arts. 28, 42 e 385, acima referidos), a regra da obrigatoriedade não tem amparo direto nem na Constituição Federal nem em quaisquer documentos internacionais sobre Direitos Humanos assinados pelo Brasil, o que torna suspeita, mesmo, a sua natureza de princípio.”; E a lição do professor Paulo Queiroz surge esclarecedora: “Também por isso, só cabe falar de obrigatoriedade num sentido muito limitado, como obrigação de oferecer a denúncia, se e quando presentes seus pressupostos e requisitos legais (fummus commissi delicti), não no sentido de levar adiante uma acusação que se sabe ou se revelou infundada, isto é, sem justa causa, razão pela qual nada impede que o MP proponha, a seguir, a sua rejeição ou absolvição sumária do denunciado, entre outras medidas legais cabíveis.”; Ademais disso, noutro giro: do princípio ne procedat iudex ex officio decorre que o magistrado não deve prover na inexistência de um pedido. O que também implica inferir que o juiz também não está autorizado a prover diversamente do que lhe foi pedido pelo dominus litis. Assim é a preciosa lição do professor Gustavo Badaró (2013, p. 39): “O ne procedat iudex ex officio nada mais é do que corolário ou consequência do direito de ação. E, reflexo de ambos, surge a vedação de o juiz pronunciar-se sobre algo que não integrou o objeto do processo, isto é, a proibição de que o juiz profira um provimento sobre matéria que não foi trazida ao processo quando uma das partes exerceu o direito de ação; o juiz agiria de ofício e violando a regra da inércia da jurisdição”; Vale dizer, se o magistrado não está autorizado pelo ordenamento a condenar além do pedido formulado (ultra petita) pelo órgão acusador – sem observância das regras da emendatio e da mutatio libelli (CPP, arts. 383 e 384) -, de igual maneira não está o magistrado autorizado a condenar sem o pedido de condenação, isto sob pena de violação ao princípio da correlação entre a acusação, a defesa e a sentença; A jurisprudência pátria vem se debruçando sobre o tema, e a questão já foi enfrentada pela 5ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Minas Gerais no RESE 1.0024.05.702576-9/001: “IV – A vinculação do julgador ao pedido de absolvição feito em alegações finais pelo Ministério Público é decorrência do sistema acusatório, preservando a separação entre as funções, enquanto que a possibilidade de condenação mesmo diante do espaço vazio deixado pelo acusador, caracteriza o julgador inquisidor, cujo convencimento não está limitado pelo contraditório, ao contrário, é decididamente parcial ao ponto de substituir o órgão acusador, fazendo subsistir uma pretensão abandonada pelo Ministério Público.”; Também o egrégio Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, ao julgar o RECURSO CRIMINAL RC 459 BA (TRE-BA), decidiu: “Ementa: Recurso criminal. Artigo 299 do Código Eleitoral c/c Art. 71 do Código Penal. Procedência. Prática do ilícito. Não comprovação. Pedido de absolvição pelo Ministério Público. Provimento. Dá-se provimento a recurso, uma vez que não tendo sido suficientemente demonstrada a conduta imputada ao recorrente, o que motivou o pedido de absolvição pelo Ministério Público, deve ser provido o recurso para absolver o réu dos crimes descritos na denúncia.”; Ademais, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, quando da análise da Apelação Crime ACR 70055944359 RS (TJ-RS): “1. Não há suporte constitucional para a emissão de um juízo condenatório quando o Estado-acusador pediu a absolvição, e mesmo o reconhecimento de uma situação mais gravosa ao acusado, daquela esposada pelo Ministério Público. Havendo provimento ministerial no sentido absolutório ou desclassificatório, é defeso ao magistrado afastar a situação mais favorável ao réu, postulada pelo órgão acusador, sob pena de violação do contraditório e da correlação entre acusação e sentença.”; Assim sendo, por certo, em decorrência do princípio acusatório e do princípio da correlação, identifica-se uma relação de prejudicialidade entre o convencimento do órgão do Ministério Público e o convencimento do magistrado. Vale dizer: se para que haja condenação juridicamente válida faz-se necessário expresso pedido de condenação pelo órgão acusador, o pedido de absolvição, de sua vez, equivale à retirada da acusação, uma vez que esta não está sendo sustentada por seu titular privativo; Afigura-se, assim, que semelhante decreto condenatório, como o que se deu no caso concreto ora debatido, sem pedido final de condenação por parte do Ministério do Público, estará fundado em uma pretensão punitiva que deixou de ser veiculada em juízo, verdadeira “não acusação”, sendo tal decisum condenatório nulo em razão do nullum iudicium sine accusatione. Nesse mesmo sentido, a doutrina: “Como pretensão, pode ser entendido aquele provimento que se deseja obter ao fim do processo. Se o juiz deixar de proferir sentença nos moldes da pretensão formulada pelo acusador, violará os Princípios da Correlação entre acusação e sentença e da Inércia da Jurisdição (em razão de prover além do que foi requerido pelas partes), o que tornará nulo o provimento, por error in procedendo. Diante da interposição de recurso, será necessária a prolação de nova decisão pelo órgão que prolatou a anterior, nos limites da pretensão ministerial – ou seja, absolvendo o réu.” (Karine Azevedo Egypto Rosa e Renata Moura Tupinambá); Aury Lopes Jr., citando Geraldo Prado, é enfático: “Como o contraditório é imperativo para validade da sentença que o juiz venha a proferir, ou, dito de outra maneira, como o juiz não pode fundamentar sua decisão condenatória em provas ou argumentos que não tenham sido objeto de contraditório, é nula a sentença condenatória proferida quando a acusação opina pela absolvição. O fundamento da nulidade é a violação do contraditório.”; Assim sendo, tem-se que no caso concreto o advento da condenação deu-se, portanto, ao arrepio da indispensável paridade de armas entre as partes. Explica-se: como já multicitado, após a instrução criminal, em alegações finais escritas, o Ministério Público pediu a absolvição do réu, logicamente não suscitando argumentos em prol da condenação; Isso implica reconhecer que em decorrência da dita manifestação do Parquet não havia o que ser contraditado pela defesa técnica, que, em suas alegações finais não se colocou em posição de resistência (pois não poderia adivinhar que a douta magistrada quebraria a regra da inércia da jurisdição e o princípio da correlação entre acusação e sentença) o que, obviamente, fez com que determinadas questões escapassem ao acurado debate exigido pela ampla defesa. Eis, pois, infringidos os princípios do Contraditório e Ampla Defesa e o Devido Processo Legal; E assim corrobora a doutrina: “O pedido formulado pela acusação ao final da instrução, além de delimitar concretamente as possibilidades do pronunciamento judicial, assegura a plenitude de defesa. O requerimento de condenação pelo Ministério Público é necessário para que, através de seu conteúdo, possa ser produzido um debate válido, tendo ambas as partes delimitado seu alcance” (Karine Azevedo Egypto Rosa e Renata Moura Tupinambá); Dessarte, no caso sub examen, pode-se dizer que diante da formulação ministerial pela absolvição do réu, não caberia à julgadora outra postura, sob pena de nulidade daquele decisum, que não a de seguir o parecer absolutório proferido pelo órgão acusador (ou extinguir a Ação Penal, cf. Vladimir Aras), e assim o é pela singela razão de que a conclusão final do Ministério Público representa a própria pretensão estatal acerca da acusação, gerando efeito vinculante para o julgador) http://emporiododireito.com.br/leitura/se-o-ministerio-publico-pugna-pela-absolvicao-do-reu-em-alegacoes-finais-pode-o-juiz-prolatar-sentenca-penal-condenatoria-por-g-couto-de-novaes