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Reflexões sobre a (in)constitucionalidade da multa prevista no Art. 265, do CPP - 22/07/2020

Reflexões sobre a (in)constitucionalidade da multa prevista no Art. 265, do CPP (Em julgamento virtual iniciado no dia 26 de junho de 2020, após dez anos em tramitação no STF, a Min. Carmen Lúcia, Relatora da ADI nº 4.398, proferiu voto, posicionando-se pela constitucionalidade do Art. 265, do CPP, que prevê a aplicação de multa ao defensor que abandona o processo penal e, consequentemente, pela improcedência do pedido; A ação foi proposta em 2010 pelo Conselho Federal da OAB, sustentando a inconstitucionalidade do aludido dispositivo, que vem ganhando larga aplicação pelos juízos criminais de todo o Brasil, ao fundamento de violação às regras do devido processo-legal (por impor penalidade em desrespeito ao contraditório e ampla defesa – artigo 5º, LIV e LV da CF/88), por restringir a livre advocacia (Art. 133, da carta Magna) e por usurpar atribuição da Ordem de punir advogados; A insurgência ganhou maior visibilidade, após a alteração do Art. 265, do CPP, pela Lei nº 11.719/2008, que atualizou o valor da multa antes existente para o intervalo de 10 (dez) a 100 (cem) salários mínimos, e passou a estabelecer, de forma expressa, que a imposição da multa não exclui outras providências cabíveis em relação à atuação do profissional que abandona a causa; Com isso, parte da jurisprudência passou a construir a ideia de que a aplicação da multa é uma sanção de natureza processual ao defensor enquanto a eventual transgressão disciplinar seria uma sanção administrativa, passível de imposição pelo órgão de classe (defesa privada) ou pela corregedoria (defesa pública); Sim, porque, embora haja pouco debate sobre a incidência do Art. 265, do CPP, quando da atuação dos defensores públicos, os tribunais brasileiros entendem pela possibilidade de aplicação da multa à Defensoria Pública, enquanto Instituição, que poderá cobrar regressivamente do membro defensorial que supostamente deu causa à constatada situação de abandono/ geradora do prejuízo pecuniário. Sobre o assunto, vale conferir posição firmada no STJ, RMS 54.183/SP, Relator Min. Ribeiro Dantas; Nas razões de seu voto, a Min. Carmen Lúcia sustenta a constitucionalidade do dispositivo nos pilares da indisponibilidade do direito à defesa técnica, da prejudicialidade à administração da justiça e à duração razoável do processo, destacando – ademais – a função pública do advogado no processo penal. E, para legitimar a possibilidade de imposição da multa, Sua Excelência enfatiza: Diferente do alegado pelo autor, a conduta sancionada pelo Art. 265 do Código de Processo Penal é clara. Trata-se de situação descrita com especificidade suficiente a se interpretar a sua ocorrência quando o advogado deixa de atuar na defesa do réu (abandona) injustificadamente, sem comunicação prévia ao juízo; Contudo, os Ministros Marco Aurélio Melo e Edson Facchin apresentaram votos-vista, sustentando a inconstitucionalidade da multa prevista no Art. 265, do CPP; Corroborando a tese autoral, o Min. Marco Aurélio ainda destacou que a inconstitucionalidade também reside na “proibição peremptória ao aproveitamento do salário mínimo como indexador econômico” (Art. 7º, IV, CF/88), relembrando que se trata de questão pacificada no próprio STF, conforme ADI nº 1.425/PE, de sua relatoria; Por sua vez, o Min. Edson Facchin, enfatizou que “a cominação da pena de multa para o defensor que abandona o processo retira da profissão de advogado o espaço de liberdade assegurado pelo Art. 5º, XIII da Constituição Federal”, relembrando – também – posicionamento consolidado na Corte, segundo o qual “nenhuma penalidade poderá ser imposta, mesmo no campo do direito administrativo, sem que se ofereça ao imputado a possibilidade de se defender previamente. A preterição do direito de defesa torna írrito e nulo o ato punitivo (STF – ADI 2.120/AM, Min. Celso de Mello)”; Desde já, acompanhando o entendimento divergente, entendo que o voto da Eminente Relatora traz à reflexão alguns pontos sobre o Art. 265, do CPP: definição de abandono da causa; natureza da multa e o procedimento para a sua aplicação; Pois bem. Qual o conceito de abandono como fundamento idôneo para possibilitar a adoção de alguma medida por parte do magistrado que preside o feito criminal?; O STJ, embora se posicione pela possibilidade, em tese, de aplicação da penalidade prevista no Art. 265 do CPP, há muito sedimentou o entendimento de que deixar de “realizar apenas um ato processual” não configura abandono (Min. Nefi Cordeiro, AgRg no RMS nº 53.641/SP) e que somente poderia ser imposta a multa “naquelas situações em que fique demonstrado que, sem comunicação prévia ao juiz do feito, o advogado (defensor) abandonou, sem justo motivo, o processo, a causa, deixando o cliente indefeso.” (Min. Maria Thereza de Assis Moura, RMS 51.511/SP); Daí extraímos que a noção mais precisa de abandono da causa estaria associada à de vulnerabilidade da defesa técnica gerada com a conduta omissiva do defensor, uma vez que o processo penal, enquanto instrumento de garantias, vai para além de atos isolados, devendo ser visto em seu conjunto; Feitas essas considerações preliminares, de logo, posiciono-me pela inconstitucionalidade da aludida multa, apesar de constatar, no exercício da atividade judicante, algumas situações que ocorrem, dificultam o andamento do feito, e têm servido como fundamento para aplicação da pena processual por aqueles que advogam o seu cabimento, a saber: ausência de advogado constituído para audiência; não atendimento de despacho para a prática de ato inerente à atuação defensiva (sobretudo, apresentação de alegações finais ou razões de recurso); inobservância do procedimento relativo à renúncia aos poderes outorgados no mandato; E isso nos coloca frente aos demais pontos destacados para a reflexão. Com efeito, por motivos que os juízos criminais inicialmente desconhecem, já que as hipóteses geradoras das multas impostas e/ou de ofícios expedidos à OAB e Corregedorias decorrem muito mais do silêncio que do não acolhimento de justificativas, essas situações alteram momentaneamente a tramitação regular do feito; Entretanto, podem ser remediadas por outras formas: nomeação de outro advogado para a realização da audiência; intimação do acusado sobre a omissão de seu defensor, a fim de que o ato seja praticado em novo prazo consignado, com advertência de encaminhamento à assistência da Defensoria Pública ou de advogado dativo (onde não tiver órgão defensorial); e atendimento aos ditames legais relativos à renúncia para regularizar a representação processual; Sobre o último ponto (inobservância do procedimento relativo à renúncia de mandato), destaca-se que o Art. 3º, do CPP, possibilita a aplicação supletiva das normas do processo civil quando não colidentes com os princípios norteadores do processo penal. Desta forma, imperioso que o advogado observe a necessidade de cientificar o acusado da renúncia aos poderes outorgados, comunicando no feito esta conduta (Art. 112, CPC/2015), sendo indevido o peticionamento para que o juízo assuma ônus que não lhe compete; Portanto, todas as falhas de atuação apontadas de forma meramente exemplificativa (mas, extraídas da vivência diária) são passíveis de contorno, não sendo motivo bastante para que consideremos atos prejudiciais à administração da justiça e geradores de violação à defesa técnica; Ademais, se o fundamento da multa é, também, garantir a duração razoável do processo com a prática do ato pela defesa, a sua imposição, por si só, não serve a este propósito, pois – na prática – não se pode obrigar o defensor a atuar positivamente no caso concreto; Desta forma, pensamos que a multa do Art. 265, do CPP, funciona, na verdade,  como instrumento de ameaça, numa tentativa de não ocorrência de situações de omissão por parte da defesa técnica, o que, evidentemente, fere o livre exercício da profissão; Reafirmando minha discordância quanto à multa em análise, discordo – também – quanto à natureza de sanção processual a ela conferida. Vejamos; Se traçarmos um paralelo com o processo civil, na tentativa de aproximar a temática ao máximo de uma hipótese efetiva de aplicação de multa processual, deparamo-nos com os artigos que estabelecem os deveres das partes, dos seus procuradores e de todos aqueles que, de alguma forma, participam do processo (artigos 77 e 78, CPC/2015); Com tal disciplinamento, visa-se evitar atos atentatórios à justiça, em especial, a litigância de má-fé. Ainda que “abandono de causa” e “litigância de má-fé” sejam institutos diversos, ambos resultam na possibilidade de imposição de multa como sanção ao comportamento do seu causador. E, como já dito, essas multas são consideradas penas processuais; Entretanto, o Art. 77, § 6º, do CPC/2015, é expresso ao afirmar que os advogados -públicos ou privados – não estão sujeitos a penas processuais, competindo ao magistrado que conheça de eventuais faltas disciplinares apenas o encaminhamento de peças do processo aos órgãos competentes (de classe ou corregedoria) para apuração; Ademais, no voto da Min. Nancy Andrighi, STJ, Relatora do REsp 1.641.154/BA, tem-se que “a litigância de má-fé traz em si a noção de que deve ser punida a parte que atua com intenção de prejudicar a outra”; Com isso, fica claro que as penas processuais são impostas às partes do processo, e não aos seus advogados; Considerando que o processo penal foi eleito como instrumento civilizado e necessário ao exercício do poder punitivo estatal, a sua finalidade, enquanto atividade de reconstrução de um fato histórico (o caso penal), é o acertamento da pretensão acusatória aviada e resistida pela defesa, cenário no qual devem ser respeitadas as regras do jogo; A função do magistrado, portanto, deve estar focada no fim precípuo da jurisdição penal. O defensor não é parte no processo criminal. Apesar de exercer múnus indispensável à administração da justiça, sua conduta é balizada por normas ético-disciplinares previstas no Estatuto da OAB e nas Leis Orgânicas das Defensorias Públicas; Logo, violações a essas regras devem ser analisadas pelos órgãos competentes, não cabendo ao magistrado criminal se imiscuir em tais questões, cuja reserva é adstrita ao Tribunal Ético Disciplinar da OAB ou às Corregedorias, conforme advogado ou defensor público, através de procedimento em que seja garantido ao profissional o contraditório e a ampla defesa de modo satisfatório, o que não existe como questão incidental durante a tramitação da ação penal em que a sua conduta é questionada; Afinal, apesar de prever a aplicação da penalidade, o Art. 265, do CPP, não estabelece procedimento que permita, de forma satisfatória, a defesa por parte do defensor, sequer havendo recurso contra a imposição da multa, mas tão somente a possibilidade de manejo de ação impugnativa autônoma (mandado de segurança) contra direito líquido e certo violado, diverso da liberdade; Neste aspecto, é certo que existe, no processo penal, situações em que não há recurso criminal previsto para impugnar uma decisão proferida, como é o caso, por exemplo, do indeferimento de habilitação como assistente de acusação. Mas, observe. A decisão atinge pessoa que pretendia status de pessoa interessada no feito, não o advogado, o que somente reafirma a incorreção de enquadramento da multa do Art. 265, do CPP, como sanção processual; Pelas razões aqui expostas, alinhadas aos fundamentos da divergência, entendemos inconstitucional a multa prevista para o defensor que “abandona a causa”, apenas subsistindo a segunda possibilidade prevista no Art. 265, do CPP: remessa do assunto relacionado à suposta atuação deficiente da defesa para apuração pelos órgãos competentes; Com efeito, ao reconhecer a necessidade de respeito ao contraditório e à ampla defesa; o direito ao livre exercício profissional; a impossibilidade de utilização do salário mínimo como indexador econômico; a real abrangência do que vem a ser abandono de causa; a diferença entre atos da parte, do seu representante e suas implicações no processo; a função do magistrado no exercício da jurisdição penal; a reserva de atribuição de cada órgão para apurar as eventuais transgressões disciplinares dos seus atores processuais; estamos reafirmando o compromisso com o Estado Democrático de Direito, garantindo que haja uma atuação defensiva destemida, mas eticamente comprometida, competindo uma atuação mais incisiva por parte da OAB e das Corregedorias na apuração e punição disciplinar dos advogados e defensores públicos que porventura cometam faltas prejudiciais à efetiva assistência dos acusados) https://canalcienciascriminais.com.br/reflexoes-sobre-a-inconstitucionalidade-da-multa-prevista-do-art-265/
Autor: Drº Mattosinho

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