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Prescrição da cloroquina incrementa os riscos penais para os médicos - 11/06/2020

Prescrição da cloroquina incrementa os riscos penais para os médicos (Inicialmente, o Ministério da Saúde autorizou a disponibilização destes medicamentos apenas para o tratamento de pacientes com formas graves da Covid-19 [1], mas, no último dia 20 de maio, o órgão — já comandado por "militar de confiança" do presidente — alterou o protocolo, recomendando o tratamento precoce com cloroquina a todos os pacientes. Como se percebe, os médicos brasileiros foram lançados ao tormento de campanhas oficiais de desinformação e contrainformação que aumentam os perigos à saúde pública, ao mesmo tempo em que incrementam riscos de responsabilização criminal deles próprios; Como premissa, o ato médico deve ser considerado regular e legítimo sempre que amparado em determinados requisitos objetivos e subjetivos, o que vale tanto para o tratamento curativo, quanto aos tratamentos de finalidade exclusiva ou preponderantemente experimental, em que se incluiriam o uso da cloroquina, hidroxicloroquina ou outras drogas não testadas integralmente para o tratamento da Covid-19; Além de praticada por médico ou pessoa habilitada, a intervenção médica penalmente atípica — em que se inclui a prescrição ordinária de medicamentos — deve estar amparada em uma indicação médica, praticada com intenção terapêutica e estar de acordo com o "estado dos conhecimentos e experiência da medicina (lexis artis)" [5]. A esses requisitos, somam-se o dever de assistência, o dever de esclarecimento e o consentimento informado, circunstâncias que, se adequadamente atendidas, implicarão em exclusão da tipicidade penal, ou ao menos causa de justificação da conduta médica [6]; Afinal, o médico incorre em crime ao receitar medicamentos para a Covid-19 que não estejam convalidados, em definitivo, pelo conhecimento biomédico? Em específico, a prescrição de cloroquina/hidroxicloroquina para o tratamento da moléstia causada pelo coronavírus sujeita os médicos a riscos de responsabilização criminal?; Todo tratamento experimental incrementa riscos jurídicos, pois, embora vise à cura de um paciente, o médico emprega técnicas, métodos e medicamentos em fase de afirmação e convalidação científica. Em concreto, a indicação que sustenta a prática médica experimental deve justificar-se, empiricamente, na ineficácia das ferramentas até então "experimentadas e consagradas na medicina". O médico deve ter condições de demonstrar, como se refere Mantovani, a "real idoneidade curativa do tratamento adotado, quer dizer, a sua utilidade terapêutica" [7]; No Brasil, o registro de medicamentos sujeita-se à regulação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, que determina a especificação das indicações médicas na bula. Evidentemente não se obsta que um dado medicamento tenha o uso ampliado para o tratamento de outra doença, ou para fase diferente da mesma patologia para a qual a indicação fora aprovada. A Anvisa pode deliberar sobre a validade de outras indicações médicas a um remédio já existente, mas, após a aprovação, estas passarão a constar na bula; Na prática da medicina, entretanto, é possível que um profissional médico entenda necessário, para enfrentar circunstâncias gravosas e emergenciais, a prescrição "off label do medicamento". Nesse caso, o emprega de forma diversa das orientações da bula, via indicações e posologias não usuais, administração por via diferente da preconizada ou em faixas etárias para as quais o remédio não foi totalmente testado; A prescrição off label de medicamentos não é desconhecida, tampouco  proibida. Segundo posicionamento do ministro do Superior Tribunal de Justiça [8] Luís Felipe Salomão, o off label trata-se de uso "essencialmente correto de medicação aprovada em ensaios clínicos e produzida sob controle estatal, apenas ainda não aprovado para determinada terapêutica". No entendimento do Conselho Federal de Medicina no Despacho Sejur nº 482/2013 [9], conquanto não vedada, a responsabilidade pela indicação off label do medicamento é "pessoal do médico”, logo, assume as consequências da prescrição por sua conta e risco; Em síntese: a intervenção médica invasiva (lícita) depende da demonstração — ancorada em provas (epistemologicamente) confiáveis — de concreta idoneidade curativa da medida ou, do contrário, o paciente converte-se em cobaia, mesmo que presente, por parte do médico, alguma intenção curativa; Sem que esteja amparado em uma indicação segura ou em conformidade à generalidade das condutas profissionais em casos análogos, o médico se submete a severo risco de responsabilização criminal; Quanto ao uso de cloroquina e hidroxicloroquina, sabe-se que Organização Mundial da Saúde (OMS) suspendeu os estudos [10], na linha defendida recentemente nos Estados Unidos, em pesquisas fomentadas pelo Instituto Nacional de Saúde e da Universidade da Virgínia. Segundo os resultados, não existem benefícios no seu uso para o tratamento da Covid-19, com indícios, em alguns casos, de agravamento do quadro clínico, e até mesmo óbito [11]. Entre os possíveis efeitos colaterais atribuídos a essas drogas encontram-se  insuficiência hepática, lesões na retina ocular e distúrbios cardiovasculares; É legítimo concluir, nesse contexto, que a prescrição de remédios à base destes ativos, seja para o tratamento precoce ou grave de pacientes portadores do novo coronavírus, constitui espécie de tratamento médico experimental que não atende ao critério objetivo da indicação "cientificamente experimentada", da qual se presume a atipicidade da intervenção médica; Suponha-se, entretanto, que estejamos errados a este respeito (já que juristas, não médicos) e que haja estudos confiáveis a respeito do uso de cloroquina para o tratamento experimental de pacientes com coronavírus. Do ponto de vista penal, neste caso, mesmo diante da evolução negativa da situação clínica, seria possível defender a prática regular da atividade médica. Diz-se em tese porque há de se perquirir um elemento fundamental da responsabilidade médica: a integridade e confiabilidade do consentimento livre e esclarecido do paciente; O "consentimento do ofendido" possui desdobramentos no Direito Penal que não se pode dar conta neste espaço. Vale salientar, contudo, que o Código Penal brasileiro refere-se ao consentimento — relativo à atuação do médico — apenas no artigo 146, no qual estabelece que não constitui crime de constrangimento ilegal "a intervenção médica ou cirúrgica, sem o consentimento do paciente ou de seu representante legal, se justificada por iminente perigo de vida" [12]; Ante a urgência da intervenção, veja-se que a lei dispensa o médico da exigência de obter o consentimento do paciente, tendo sido ele (ou família) devidamente informado ou não do procedimento. Apesar da frágil regulação, fato é que o consentimento livre e esclarecido do paciente pode ser considerado, em toda e qualquer intervenção médica, dispositivo central na definição do caráter injusto do comportamento médico; O tema conduz às questões levantadas no início desse texto. Tratando-se de medidas e protocolos médicos e sanitários para enfrentamento da Covid-19, é impossível falar em "consentimento esclarecido" no Brasil. O país governado por Jair Bolsonaro — visando à conservação de um projeto autoritário de poder, ameaçado pela crise econômica — contaminou o campo da saúde com práticas de desinformação e contrainformação, fundadas na disseminação de notícias falsas sobre o tratamento do coronavírus no país; A politização — ou mesmo militarização — da ciência brasileira deu lugar ao obscurantismo. O presidente da República já fala em armar a população para reagir às políticas pautadas pelo isolamento social. Em concreto, a guerra de contrainformação, no trato de uma das maiores crises sanitárias no país e no mundo, criou uma probabilidade concreta de lesão à vida e saúde de um número indeterminado de brasileiros e estrangeiros em território nacional; A aposta em tratamentos experimentais recomendados por autoridades públicas brasileiras, em especial, prescrição de remédios à base de cloroquina para o tratamento da Covid-19, deve ser recusada pelos médicos e demais profissionais habilitados. Os dados e indicações provenientes do governo federal não são confiáveis, uma vez que as políticas públicas se orientam por interesses políticos e critérios anticientíficos. Esse estado de coisas, lamentavelmente, incrementa os riscos penais que recaem sob o exercício profissional da medicina, além de confundir os cidadãos brasileiros que, perdidos entre crises políticas artificiais e milícias digitais, não têm condições adequadas de consentirem, livre e autonomamente, a respeito do tratamento a que devem se submeter) https://www.conjur.com.br/2020-jun-10/melchior-soares-riscos-penais-cloroquina-medicos?utm_source=dlvr.it&utm_medium=facebook
Autor: Drº Mattosinho

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