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Pós-acordo de leniência - desafios das empresas para sua reabilitação - 30/08/2019
Pós-acordo de leniência - desafios das empresas para sua reabilitação (Por “pós-leniência” refiro-me ao momento posterior àquele em que os acordos de leniência foram celebrados pela empresa e a autoridade competente, e portanto minha atenção aqui não reside tanto no âmbito da existência e da validade destes acordos, mas na sua eficácia, implementação e efetividade, ou seja, na sua execução, até o momento do seu final e fiel cumprimento; Entendo que o legislador brasileiro levou em consideração o “pós-leniência”, ao determinar no Art. 16, §4º, da LAC que “o acordo de leniência estipulará as condições necessárias para assegurar a efetividade da colaboração e o resultado útil do processo”. De modo mais detido, o Art. 36 do Decreto federal nº 8.420/15 estabeleceu que “o acordo de leniência estipulará as condições para assegurar a efetividade da colaboração e o resultado útil do processo, do qual constarão cláusulas e obrigações que, diante das circunstâncias do caso concreto, reputem-se necessárias”; O primeiro dos principais desafios para as empresas relaciona-se à busca da superação ou mitigação dos riscos políticos, institucionais e financeiros atinentes ao acordo de leniência em si, os quais tendem a dificultar sobremaneira a estabilização do vínculo leniente originalmente firmado, o que não tem se mostrado tarefa fácil, por fatores como: (i) ambiente de perseguição política e retaliação institucional (a depender do conteúdo das colaborações firmadas) e constantes trocas de comando e políticas internas das cúpulas e órgãos responsáveis pela leniência e de seu controle e fiscalização, o que usualmente interfere de forma negativa na segurança jurídica do acordo firmado, (ii) persistência de cenário de disputa institucional entre os diferentes órgãos e entidades competentes para firmar acordos desse gênero, como MPF, CGU, CADE, Ministérios Públicos Estaduais, sem contar a atuação de órgãos de controle como TCU e Tribunais de Contas Estaduais e Municipais, os quais possuem diferentes olhares e opiniões sobre a regulamentação e o modo de execução das obrigações originalmente firmadas na leniência,[3] e acabam “concorrendo” entre si, instabilizando o vínculo da leniência firmada e (iii) dificuldades financeiras da empresa após a celebração da leniência, oriundas sobretudo da crise reputacional que se origina muitas vezes do fato “acordo de leniência”, e que leva estas empresas a quadros deficitários gravíssimos, incluindo falência ou recuperação judicial, e que por sua vez levam a pleitos de revisão das bases originais da leniência, pois o pagamento dos danos e multas tornam-se excessivamente onerosos (ciclo vicioso da leniência).[4] Este e outros fatores similares tornam extremamente difícil à empresa antever e executar providências adequadas voltadas à razoável blindagem jurídica das leniências, embora tenha de ser este o maior objetivo das empresas que firma este tipo de acordo; O segundo dos principais desafios para as empresas que firmaram acordos de leniência com o Ministério Público Federal-MPF - como Odebrecht (2016) e J&F (2017), e mais recentemente a Rodonorte, concessionária de rodovias integrante do grupo CCR (2019) – é a necessária submissão e convivência com o Monitor de Compliance Independente,[5] a quem cabe (em apertadíssima síntese) realizar uma série de ações e tomada de providências voltadas à aderência da empresa aos termos da leniência rumo ao seu cumprimento integral, apoiando-a em seu caminho de final reabilitação empresarial e resgate reputacional, em decorrência das práticas de corrupção reconhecidas no acordo de leniência; O Monitor Independente é um profissional de reputação ilibada, notória especialização e imparcial, indicado pela empresa, aprovado pelo MPF e remunerado pela empresa – no caso J&F, trata-se de Comitê Independente, composto por três profissionais – que se constitui em longa manus do MPF, e que terá uma série de atribuições voltadas ao acompanhamento da execução do acordo de leniência, verificando o cumprimento in loco das obrigações assumidas pela empresa no acordo. Concomitantemente coach e referee da empresa, o Monitor atuará de modo independente no processo de revitalização da empresa, para que esta possa o mais rapidamente possível retomar o curso natural dos negócios e sair do pós-leniência melhor do que ingressou – corporate get well program; Certamente aqui o desafio para a empresa será intentar compatibilizar o normal prosseguimento da atividade empresarial com o atendimento das constantes diretivas e intervenções do Monitor, com ele dialogando permanentemente, visando sempre a boa e fiel execução das obrigações assumidas no acordo de leniência, até o seu final cumprimento, o que nem sempre será fácil, pois eventuais conflitos costumar surgir e deverão ser prevenidos e/ou dirimidos com tenacidade e sofisticação ímpares; O terceiro e último desafio a ser exposto nesta oportunidade diz respeito à convivência nem sempre harmoniosa entre acordos de leniência, fatos relevantes para o mercado financeiro (Instrução CVM nº 358/02),[6] alienação e venda de ativos pós-leniência[7] e cláusulas contratuais anticorrupção (hoje previstas de modo generalizado em contratos públicos e privados, nacionais e internacionais); Se em um primeiro momento a celebração de um acordo de leniência mostra-se como a melhor solução de última ratio para a empresa que teve descoberta participação sua em práticas de corrupção, é igualmente verdadeiro que por afetar a situação econômico-financeira da companhia, a leniência em si constitui fato relevante ao mercado financeiro e deve ser comunicada de modo amplo, desencadeando reações que nem sempre são favoráveis à empresa,[8] piorando inclusive a sua já comprometida saúde financeira. Além disso, a existência do acordo de leniência pode ser interpretada por parceiros comerciais da empresa que o celebrou como hipótese de incidência das sanções típicas de “cláusula anticorrupção”, podendo motivar açodada rescisão de contratos firmados anteriormente à celebração do acordo de leniência.[9]; O que pretendo destacar aqui é que, se por um lado a leniência procura mitigar ou reduzir danos ao negócio, imagem e reputação corporativa no mercado e na sociedade, de outro lado ela desencadeia uma série de novos fatos, os quais passam a ser foco de novas preocupações para a empresa, que por sua vez necessitam ser geridos adequadamente, para não impingir mais e piores prejuízos à corporação. O desafio para a empresa, portanto, é tentar alinhar acordo de leniência, comunicações para o mercado, alienação de ativos pós-leniência e interpretação razoável de cláusulas contratuais anticorrupção, para que não se comprometa ainda mais a difícil situação que a descoberta e reconhecimento de práticas de corrupção acabaram por acarretar à empresa; Atuei como consultor e parecerista em diversos casos de corrupção corporativa, em sede judicial e extrajudicial, inclusive antes, no transcurso e após a celebração de acordos de leniência. Minha experiência profissional e atuação acadêmica nacional e estrangeira levam-me a indicar aquilo que aparentemente possa soar lugar comum: o acordo de leniência pode até finalizar uma fase de instabilidade que a empresa deseja superar rapidamente, mas os desafios que a ela se impõem no pós-leniência muitas vezes são maiores e muito mais complexos do que o processo de negociação da leniência possa eventualmente ter demonstrado. Por isso, a presença e o acompanhamento de experts externos à corporação podem ser cruciais para que a empresa possa retomar definitivamente, em um horizonte não muito longínquo e sem maiores perdas, o percurso para a sua mais completa reabilitação, revitalização e resgate reputacional) https://www.conjur.com.br/2019-ago-28/pos-acordo-leniencia-desafios-empresas-reabilitacao?utm_source=dlvr.it&utm_medium=facebook