Você tem garantias e direitos, portanto, conte com o seu Advogado de confiança para defendê-lo (a)
Notícias
Artigos
O valor das confissões no acordo de não persecução penal - 08/06/2020
O valor das confissões no acordo de não persecução penal (Seria essa confissão uma declaração de vontade de adesão ao acordo assumindo, genericamente, os fatos narrados no inquérito ou na investigação privada como verídicos e, portanto, nada mais seria do que uma confissão ficta? Nos parece que sim, mormente se efetuada a leitura do caput em conjunto com o conteúdo do §4º, segundo o qual "a homologação do acordo de não persecução penal, será realizada audiência na qual o juiz deverá verificar a sua voluntariedade, por meio da oitiva do investigado na presença do seu defensor, e sua legalidade"; Ou seria, pelo contrário, um relato detalhado sobre todas as circunstâncias? Pois bem. Ressalte-se que, quando concebido o instituto, pelo Conselho Nacional do Ministério Público, a intenção do órgão claramente era interpretar desta forma, tanto que, no artigo 18 da Resolução nº 181/2017 do CNMP se exigia que o investigado confessasse "formal e detalhadamente a prática do delito". Igualmente parecia ser esse o objetivo inicial do legislador, cuja redação primeva no projeto contemplava o oferecimento do ANPP "se o investigado tiver confessado circunstanciadamente [7] a prática de infração penal"[8]. Sem embargo, essa dicção não foi promulgada pelo legislador. No meio do caminho foi apresentado um substitutivo do projeto e aprovado o texto: "Tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente [9] a prática de infração penal". Uma tal alteração não foi despropositada, afinal, o significado das expressões "cicunstanciadamente" e "circunstancialmente" são distintos; Entrementes, por ora, cada membro representante do Ministério Público tem entendido e negociado os acordos à sua própria maneira [10]. De modo semelhante se pode sustentar em relação ao uso do conteúdo do pacto pelos magistrados; Em uma pesquisa que realizamos sobre acordos dessa natureza celebrados no Estado de São Paulo [11], foi possível obter um dado relevante: em 35% [12] dos casos de concurso de pessoas [13], o conteúdo da confissão do corréu — e, por vezes, a própria confissão genérica em si mesma — que celebrou o acordo de não persecução penal foi considerada no mérito da prolação da sentença, ou seja, foi utilizada para condenar o coautor ou partícipe; Acontece que a utilização da confissão de um corréu como mecanismo de auxílio para obtenção de provas ou mesmo como conteúdo informativo a ser corroborado por elementos externos do bojo probatório corresponde a outro instituto do processo penal bastante conhecido: a colaboração premiada; Assim, nesses casos, o que se observa é a tentativa ilegal de transposição de elementos da colaboração premiada, cujos requisitos e pressupostos seriam mais complexos, ao ANPP, que tem rito e características simplificadas; Ora, justamente por isso é que a homologação do acordo foi enquadrada pelo legislador como de alçada do juiz de garantias, o que impediria o conhecimento do conteúdo da composição pelo juiz da instrução. Talvez para os procedimentos vindouros — quando e se declarado constitucional o conteúdo normativo do artigo 3º-B do Código de Processo Penal — esta questão se perca. Todavia, até que isso aconteça, é necessário se analisar as coisas como elas são; É preciso repisar que o ANPP é um negócio jurídico processual entre partes: de um lado situado o investigado, assistido por seu defensor, e, do outro, o Ministério Público. Como se percebe, não há espaço para coautores ou partícipes nesta relação negocial personalíssima, de modo que, qualquer declaração nela proferida, se utilizada em âmbito processual — quer em instrução, quer em fase de sentença —, contra o outro corréu que não pôde pactuar o acordo violará diretamente o contraditório e a ampla defesa; Outrossim, registre-se que, nos casos em que exigida uma confissão detalhada, jamais se poderia permitir que o mesmo magistrado condutor da audiência de celebração e homologação da composição fosse o mesmo da instrução, tendo em vista que ele já tomou conhecimento do conteúdo da declaração do corréu e, portanto, dela não poderá mais desconhecer; Ademais, não nos parece que a intenção do legislador fosse fornecer um atalho para contornar a colaboração premiada. Destarte, caso pretenda a autoridade usufruir de eventuais declarações de um dos réus para condenar o outro, ofertando-lhe, em permuta, um benefício, deve recorrer, então, ao regramento da colaboração premiada, e não dos acordos de não persecução penal; O correto, portanto, ao nosso ver, seria que, nos casos de coautoria em que não se faculta a todos os corréus a possibilidade de celebração de tais acordos, haja o desmembramento do processo — submetendo-os a juízes distintos — a fim de não se contaminar a imparcialidade do magistrado em relação àquele corréu para o qual a persecução prosseguirá) https://www.conjur.com.br/2020-jun-08/nicolai-ferreira-valor-confissoes-anpp?utm_source=dlvr.it&utm_medium=facebook