Você tem garantias e direitos, portanto, conte com o seu Advogado de confiança para defendê-lo (a)
Notícias
Artigos
O papel do Ministério Público no processo penal - o precedente Brady vs. Maryland e a normativa do Conselho da Europa - 17/04/2020
O papel do Ministério Público no processo penal - o precedente Brady vs. Maryland e a normativa do Conselho da Europa (Em um voto memorável no caso Brady vs. Maryland, de 1963, O juiz William O. Douglas da Suprema Corte dos Estados Unidos pontificou que “a sociedade não ganha apenas quando um culpado é condenado; ganha também quando os julgamentos criminais são justos”; Este voto me veio à memória quando li o projeto de Lei 5282/2019, apresentado em setembro de 2019 pelo senador Antônio Anastasia; Nesta linha, o projeto contribui para adequar nosso modelo persecutório a uma importante normativa de soft law internacional: os princípios 13 e 14, das Regras de Havana de 1990, aprovadas pelas Nações Unidas no seu VIII Congresso Criminal; De fato, nos Princípios Orientadores Relativos à Função dos Magistrados do Ministério Público lê-se que no exercício das suas funções tais autoridades devem dar prova de imparcialidade e agir com objetividade, tomando em consideração a posição do suspeito e da vítima, tendo em conta “todas as circunstâncias pertinentes, quer sejam favoráveis ou desfavoráveis ao suspeito”; O Princípio 14 das Regras de Havana exorta os “magistrados do Ministério Público” a não encetar nem continuar investigações criminais ou a fazer o possível para as suspender “se um inquérito imparcial revelar que a acusação não é fundada”; O projeto aproxima ainda mais nosso processo do modelo acusatório, no qual o prosecutor tem o dever de revelar provas incriminatórias e exculpatórias à defesa no procedimento prévio de criminal discovery, tal como decidiu a Suprema Corte americana no célebre precedente Brady vs. Maryland, da Corte de Warren, em 1963; O projeto em tela modifica o Art. 156 do CPP e no §1º diz que, a fim de estabelecer a verdade dos fatos, cabe ao Ministério Público alargar ou ampliar a investigação de modo examinar todos os fatos e provas pertinentes para a determinação da responsabilidade criminal, em conformidade com o código e a Constituição Federal; Para esse fim, o MP deve investigar não só as circunstâncias que interessam à acusação como também as que são úteis à defesa, com o que fortalece a tese acusatória, na medida em que lhe cabe o ônus de afastar a presunção de inocência, especialmente em torno de excludentes de ilicitude e causas extintivas de punibilidade, por exemplo; É fácil compreender: o Ministério Público não é só um órgão de acusação; é também custos legis e defensor de outros direitos fundamentais. Mais do que isto: é uma instituição que deve velar pelos valores da Justiça e da equidade. Por isso a frase do juiz Douglas é tão adequada ao nosso ethos e à desejável ontologia do Parquet, como uma “magistratura” firme, responsável e eficiente; Nos Estados Unidos, a American Bar Association (ABA) adota diretrizes para orientar os membros do Ministério Público (district attorneys, assistant US attorneys e prosecutors em geral). Os padrões instituídos pela Ordem nos Criminal Justice Standards for the Prosecution Function confirmam e vão além de Brady: a) exigem a investigação e documentaçãoplena dos fatos, sejam quais forem; b) obrigam o Ministério Público a revelar à defesa todas as provas que possam abalar, mitigar ou eliminar a responsabilidade criminal do réu ou influenciar sua pena, independentemente do que o promotor ou procurador considere relevante; c) deixam claro que a divulgação oportuna de provas exculpatórias à defesa é apenas um dos deveres de uma obrigação mais ampla de garantir a justiça, uma obrigação que inclui expressamente a busca de provas debilitar a acusação sustentada pelo Ministério Público; No plano europeu, há diretrizes semelhantes. A Recomendação REC(2000)19, adotada pelo Conselho de Ministros do Conselho da Europa (COE) em 6 de outubro de 2000 cuida da Função dos Membros do Ministério Público na Justiça Criminal; O princípio 26 exorta os membros do Ministério Público a observar a igualdade de todos perante a lei e a levar em conta todas as circunstâncias processais relevantes, inclusive aquelas que possam afetar o suspeito, independentemente de lhe aproveitarem ou lhe prejudicarem; O princípio 27 reforça a importância de investigações imparciais; Já o princípio 29 conclama promotores e procuradores a revelar à defesa, salvo quando houver previsão legal diversa, qualquer informação de que disponham que seja capaz de afetar o devido processo legal; O dever do MP circunscreve-se à exposição de suas “armas”, no que se conhece na common law como disclosure, isto é, a prática de disponibilizar à defesa tudo o que foi apurado na investigação criminal, inclusive aquilo que possa ajudar a rebater as teses da acusação ou a sua teoria do caso; Ademais, segundo o projeto de lei, o descumprimento das providências do §1º (vide acima) implicaria “a nulidade absoluta do processo”; A defesa deve ter acesso a todos os elementos informativos já documentados na investigação, sem ocultação ou sonegação de qualquer tipo, para que, de posse de todos os elementos colhidos, produza a resposta à acusação estatal. Garantir a ampla defesa sem supressões, aliás, é o espírito da Súmula Vinculante 14) https://vladimiraras.blog/2019/10/02/o-papel-do-ministerio-publico-no-processo-penal-o-precedente-brady-vs-maryland-e-a-normativa-do-conselho-da-europa/