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O JUIZ PODE PRODUZIR PROVAS - O BINÔMIO SISTEMA ACUSATÓRIO-INQUISITÓRIO - 07/08/2020

O JUIZ PODE PRODUZIR PROVAS - O BINÔMIO SISTEMA ACUSATÓRIO-INQUISITÓRIO (RHC 58.186/RJ, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 06/08/2015, DJe 15/09/2015; Ementa do julgado: RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO. LATROCÍNIO, ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA E CORRUPÇÃO DE MENORES. INICIATIVA INSTRUTÓRIA DO JUIZ NO PROCESSO PENAL. SISTEMA ACUSATÓRIO. COMPATIBILIDADE. LIMITES. PODER RESIDUAL. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. A estrutura acusatória do processo penal pátrio impede que se sobreponham em um mesmo sujeito processual as funções de defender, acusar e julgar, mas não elimina, dada a natureza publicista do processo, a possibilidade de o juiz determinar, mediante fundamentação e sob contraditório, a realização de diligências ou a produção de meios de prova para a melhor reconstrução histórica dos fatos, desde que assim proceda de modo residual e complementar às partes e com o cuidado de preservar sua imparcialidade. 2. Não fora assim, restaria ao juiz, a quem se outorga o poder soberano de dizer o direito, lavar as mãos e reconhecer sua incapacidade de outorgar, com justeza e justiça, a tutela jurisdicional postulada, seja para condenar, seja para absolver o acusado. Uma postura de tal jaez ilidiria o compromisso judicial com a verdade e com a justiça, sujeitando-o, sem qualquer reserva, ao resultado da atividade instrutória das partes, nem sempre suficiente para esclarecer, satisfatoriamente, os fatos sobre os quais se assenta a pretensão punitiva. 3. O uso, pelo magistrado, de seus poderes instrutórios, presentes em inúmeros dispositivos do Código de Processo Penal, não autoriza, porém, posturas de vanguarda ou de protagonismo judicial. Assim, deve ser anulada a decisão da autoridade judiciária que, ao manter o recebimento da denúncia, determinou, imotivadamente, a oitiva de delegado e de inspetores de polícia, pois ao determinar, antes do início da instrução criminal, prova não urgente e não requerida pelas partes, o Juiz agiu em substituição aos litigantes. 4. Entretanto, deve ser prestigiada a atividade probatória deflagrada depois do término da audiência de instrução, quando, na própria ata, o Juiz determinou, de ofício, a oitiva de pessoas a que as testemunhasse referiram, de forma residual e em consonância com o Art. 209, §1°, do CPP, para a correta verificação de fatos referidos durante a produção da prova oral.5. Recurso ordinário parcialmente provido para declarar somente a nulidade da decisão que, ao ratificar o recebimento da denúncia, ordenou, de ofício, a oitiva de delegado e de inspetores de polícia, devendo tais depoimentos ser desentranhados dos autos do processo, sem prejuízo de que tais testemunhos sejam requeridos pelas partes, na fase do Art. 402 do CPP, ou, justificadamente, determinados pelo Juiz, nos termos dos arts. 156 ou 209 do CPP; Em processo criminal que tramitou na 5ª Vara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (em diante, TJRJ), o Juiz de Direito, após análise da resposta à acusação, em juízo de ratificação do recebimento da denúncia, determinou a produção de prova de ofício, consistente na oitiva de Delegado de Polícia, dois inspetores e da sócia da vítima. Após audiência de instrução e julgamento, determinou oitiva de outras testemunhas; Impetrado habeas corpus ao TJRJ, sob fundamento de ofensa ao sistema acusatório, foi negada a ordem. Interposto o recurso ordinário em habeas corpus, sustentou que: E que, "a redação do comando normativo não permite que o magistrado estabeleça, por si só, todo um conjunto probatório próprio, independente daquele introduzido pelo órgão responsável pela acusação" (fl. 65), pois "uma estrutura verdadeiramente democrática e acusatória não comporta uma atividade proativa do juiz no sentido de perseguição da verdade correspondente, pois tal atividade compromete a imparcialidade exigível à magistratura" (fl. 68); O STJ deu parcial provimento ao recurso; O relator, Ministro Schietti Cruz, iniciou seu voto pela constatação de que historicamente existem três sistemas processuais penais. O acusatório puro, no qual somente as partes produziam as provas (em “duelo”), permanecendo o juiz inerte; o inquisitório, em que as funções de acusar, defender e julgar pertenciam ao juiz, que era um inquisidor e o acusado um objeto de investigação; e o misto, ao qual não teceu comentários; De acordo com o Ministro Schietti Cruz, a Constituição Federal de 88 (CF/88) teria adotado o modelo acusatório, o que se constataria dos direitos e garantias nela positivados, nada obstante, ante a publicização do processo, seria possível ao juiz colaborar na produção de provas, a fim de melhor prestar jurisdição. Segundo o Ministro, o processo penal brasileiro não poderia ser um simples duelo de partes, “sendo preferível um modelo essencialmente acusatório no qual o juiz possa determinar a produção de provas de ofício, sem que isso induza à nulidade da atividade instrutória”; Para o Ministro, o processo penal deve ter preocupação com a correta verificação dos fatos, sendo a instrução probatória realizada pelo Juiz uma necessidade decorrente dos direitos constitucionais (são citados, paz social, a educação cívica, a afirmação política do Estado Democrático de direito e proteção da liberdade humana); Cita Ada P. Grinover, para quem “não é possível imaginar um juiz inerte, passivo, refém das partes. Não pode ele ser visto como mero espectador de um duelo judicial de interesse exclusivo dos contendores [...] o juiz deve desenvolver todos os esforços para alcançá-lo. Somente assim a jurisdição atingirá seu escopo social”. Com base em Mauro Fonseca de Andrade, demonstra que mesmo em países que adotam o sistema adversarial, os juízes já possuem iniciativa probatória; Assim, nos países de cultura europeia continental, os juízes poderiam ter iniciativa probatória, conquanto de “de maneira suplementar e ao escopo de eliminar eventuais dúvidas que interfiram na apuração da verdade sobre os fatos objeto da acusação”; Ante eventual risco de perda da imparcialidade decorrente da produção probatória, o Ministro destaca que o contraditório a resguardaria e que ao determinar a produção da prova o juiz não anteciparia posicionamento acerca do conteúdo desta; Com base nas premissas levantadas, i.e., “desde que realizada de forma complementar ou residual (e não em substituição dos sujeitos interessados no resultado do processo), ante fundada dúvida sobre a reconstrução histórica dos fatos e desde que respeitado o contraditório e externada a motivação do ato judicial que determina a prova”, seria possível ao juiz determinar prova de ofício; Ao analisar as circunstâncias do caso consignou que: 1) não foram declinados os motivos da indicação de testemunhas do juízo quando da ratificação do recebimento da inicial, o que acarretaria em ofensa ao princípio da motivação; 2) as testemunhas indicadas ao fim da audiência de instrução não foi arbitrária, vez que realizada de forma subsidiária às partes; Assim, o Ministro deu provimento ao recurso para anular a decisão de ratificação do recebimento da denúncia; O Ministro Nefi Cordeiro não acompanhou o voto do relator e negou provimento ao recurso, afirmando -de início- que o juiz pode produzir provas de ofício, consignando que: “Então, é preocupante a excessiva intervenção probatória do juiz sim, mas é admitida pelo Código de Processo Penal e somente em caso de exagero, ou quando a motivação da sentença ao final isto permitir descobrir, é que se tem a perda da imparcialidade”; Assim, o Ministro entendeu lícita a produção da prova de ofício, mesmo antes de iniciada a instrução probatória, inclusive por questão de economia processual. Como segundo ponto, o Ministro ressaltou a ausência de prejuízo: “para anularmos, precisaríamos entender que houve o prejuízo; E volto a insistir, embora pareça uma contradição direta ao voto do eminente Ministro Relator, muito bem lançado: não vejo como imaginar-se prejuízo se o próprio voto do Relator assegura ao juiz produzir essa prova assim que estivermos anulando”; O voto do relator foi acompanhando pelos Ministros Ericson Maranho e Sebastião Reis Júnior. A Ministra Maria T. A. Moura proferiu voto vencido no sentido de que “não é possível que essa prova seja repetida, em momento posterior, quando terminada a instrução, conforme autorizaria o Art. 402 do Código de Processo Penal”; A atuação probatório de ofício é alvo de inúmeras pesquisas (e divergências) Brasil afora, sendo que muitos doutrinadores defendem que num sistema acusatório não caberia ao juiz produzir nenhuma prova de ofício, mesmo que de forma suplementar, atribuindo a tal modo de proceder um “quadro mental paranoico”, que encontraria respaldo na doutrina de Franco Cordero; Assim, muito embora se invoque comumente a doutrina de Cordero[1], tem-se que ela deve ser devidamente contextualizada, a fim de que não se caia em uma indevida seletividade acerca do que defende o recém-falecido doutrinador; No que toca à decisão proferida pelo Ministro Schietti Cruz, tem-se que seus fundamentos encontram base na doutrina de Ada Pellegrini GRINOVER, como citado pelo Ministro; Em artigo necessário sobre o tema, A iniciativa probatória do juiz no processo penal acusatório (1999, p. 188), GRINOVER leciona que há polivalência no sentido do binômio acusatório-inquisitório. De início, a doutrinadora deixa claro que um processo inquisitório não pode ser concebido como processo, no sentido estrito do termo (“nunca verdadeiro processo”), senão que uma forma de autodefesa da administração judicial. Para GRINOVER, existe uma falta de entendimento acerca dos binômios acusatório-inquisitório e adversarial-inquisitorial, que deveriam ser utilizados de forma correta, sendo que um sistema acusatório poderia ser adversarial ou inquisitorial. Conforme exposto do voto do Ministro Schietti Cruz, com base na doutrina de ANDRADE, Grinover acrescenta que o sistema adversarial vem cedendo espaço ao desenvolvimento oficial, o que vem atenuando as diferenças entre as duas formas de sistema acusatório; De acordo com a professora, a possibilidade de atuação de ofício do juiz está diretamente ligada com o caráter publicista do processo penal, cujo objetivo da jurisdição e do seu instrumento estão em função do Estado e aos objetivos deste, i.e., sua função social. Assim, o juiz não poderia ser um mero espectador das partes, devendo ele ser ativo e um estimulador do contraditório; Segundo a professora, o processo é um instrumento da justiça, que deve estar acima do adversarial system, que seria um reflexo de um estado liberal-individual. O processo tem como escopo descobrir a verdade, o que “não significa que a busca da verdade seja o fim do processo e que o juiz só deva decidir quando a tiver encontrado. Verdade e certeza são conceitos absolutos, dificilmente atingíveis, no processo ou fora dele”. (1999, p. 192); Leciona a professora que a iniciativa probatória do juiz não interfere em sua imparcialidade, vez que não se sabe o resultado desta prova. Defende, também, que a iniciativa probatória do juiz não é ilimitada, vez que deve obediência rigorosa ao contraditório, à motivação e à licitude das provas; Esclarecendo cada limite, a professora afirma que “a melhor maneira de preservar a imparcialidade do juiz não é alijá-lo da iniciativa instrutória, mas sim submeter todas as provas -as produzidas pelas partes e as determinadas ex officio pelo juiz- ao contraditório”; que a ausência ou falta de motivação na determinação da produção da prova e em sua valoração a invalida; e que as provas devem obediência aos valores constitucionais e às regras processuais; Conclui a professora ao explicar o que significa a busca da verdade, aquela que não decorre da exclusiva atividade das partes, que “o princípio da verdade real, que foi o mito de um processo penal voltado para a liberdade absoluta do juiz e para a utilização de poderes ilimitados na busca da prova, significa hoje simplesmente a tendência a uma certeza próxima da verdade judicial” (1999, p. 195); Percebe-se, assim, que a lição da professora Grinover encontra eco na doutrina de Cordero, vez que ambos defendem que haja o necessário contraditório quando da produção das provas, sejam elas das partes, sejam de ofício, sob pena de se invalidar sua produção. Ainda, que a posição posta no voto do Ministro Schietti Cruz, acertadamente defende a necessidade da motivação na decisão que determina a produção da prova, necessidade que não fica submissa a demonstração de prejuízo tal qual votado pelo Ministro Nefi Cordeiro, vez que a fundamentação é princípio da produção das provas, que deve sempre ser obedecido; Consoante ensina Eugênio PACELLI, é possível ao juiz ter iniciativa probatória, o que não é possível é que ele substitua o parquet, tema a ser tratado em outra coluna) http://www.salacriminal.com/home/o-juiz-pode-produzir-provas-o-binomio-sistema-acusatorio-inquisitorio?fbclid=IwAR3WkVyN2WkpWWScWhdUADG7hz8bQm6fUJC-DuZ2tWOdDqiwAaO3D5MgrE8
Autor: Drº Mattosinho

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