O Detetive Particular e a Investigação Criminal - algumas questões pontuais (trata, ademais, que para atuar o Detetive deve contar com a autorização expressa de seu contratante e com o aceite do Delegado de Polícia ou outra autoridade que presida investigações, a exemplo do Promotor de Justiça nos casos de Procedimento Investigatório Criminal (PIC); que caberá ao Delegado de Polícia ou outra autoridade que presida uma investigação criminal oficial, delimitar o grau de acesso informativo que o Detetive Particular terá com relação aos autos, sem prejudicar o sigilo necessário e nem coartar o trabalho do profissional; que com o devido ajuste, é plenamente aplicável ao Detetive Profissional a Súmula Vinculante 14 do STF; que na mesma medida e com os devidos ajustes, também aplicável a mais ampla redação advinda do Estatuto da OAB (Lei 8.906/94), a demarcar as prerrogativas do advogado na investigação criminal com relação ao seu acesso, nos termos do artigo 7º., XIV; que há casos em que o sigilo não decorre diretamente da lei, mas é decretado casuisticamente pelo Juiz de acordo com normas de Processo Penal e ditames constitucionais que excepcionam, em certos casos, o Princípio da Publicidade. A normatização dessas situações encontra-se no artigo 93, IX, CF e artigos 201, § 6º. e 792, § 1º., CPP. É claro que, por extensão, o magistrado pode decretar sigilo na fase pré - processual com fulcro nessas mesmas normativas e ainda as combinando com o artigo 20, CPP. Também é óbvio que esse sigilo somente pode ser externo, tal qual ocorre com o que advém de normas legais diretamente. Portanto, a princípio, mesmo em se tratando de sigilo judicialmente estabelecido para a fase de investigação, com a devida cautela, nada obsta a atuação do Detetive Particular, desde que cumprindo as normas legais e regulamentares respectivas; que a habilitação do Detetive Particular nesses casos deverá passar por ao menos duas fases. Num primeiro momento, deverá obter a permissão de seu contratante e do Delegado de Polícia. Havendo negativa em qualquer caso, estará impedido de atuar. Não há se falar em pedido direto ao Juiz ou “recurso” a este contra a decisão discricionária da Autoridade Policial. Isso porque, mesmo havendo o sigilo partido do magistrado, não há alteração do fato de que a este último não cabe atuar na fase investigatória, sob pena de macular sua mais preciosa característica, que é a imparcialidade, ferindo de morte o sistema acusatório; que em havendo autorização por parte do contratante e do Delegado de Polícia ou outra autoridade presidente das investigações, não parece que isso baste para que o Detetive Particular, nestes casos específicos de sigilo judicial, passe a atuar livremente. É recomendável, que, sendo o sigilo de origem judicial, o Delegado de Polícia ou outra autoridade, submeta sua decisão positiva à apreciação judicial para homologação. Embora a lei não exija isso, parece que as circunstâncias e a característica especial dessa espécie de sigilo impõem esse procedimento; que em havendo negativa do magistrado, não há se falar em recurso ou ação de impugnação (Mandado de Segurança), pois que este certamente age tal qual o Delegado, por exemplo, nos termos do Parágrafo Único do artigo 5º., da Lei 13.432/17, ou seja, discricionariamente; que em geral, havendo autorização do Delegado de Polícia e do contratante, não haverá necessidade de oitiva do Ministério Público para a atuação do Detetive Particular, seja em casos normais, seja em casos de sigilo legal ou judicial; que apenas no caso do artigo 792, § 1º., CPP, é que se fala da determinação pelo Juiz de ofício ou a requerimento “da parte ou do Ministério Público”. Entende-se que se o sigilo partiu de requerimento de defensor ou do Ministério Público, não decorrendo de atuação “ex officio” do magistrado, então será necessária sim a oitiva prévia, do requerente, seja ele o defensor, seja o Ministério Público; que o Detetive, como qualquer pessoa, funcionário público ou não, estará sujeito às sanções penais, administrativas e civis em caso de infração ao dever de sigilo; que pode surgir a dúvida quanto a provas, informações, relatórios, documentos, fotos, indícios, objetos, apresentados à Autoridade Policial, por exemplo, por Detetive Particular em investigação que envolva evento criminal antes da edição da Lei 13.432/17; que entende-se que não há óbice à admissão dessas provas e outros elementos, ainda que colhidos antes da Lei 13.432/17. Isso pode se dar com sustento no artigo 14, CPP que sempre permitiu o requerimento de diligências à Autoridade Policial; que além disso, a legislação e regulamentos que já tratavam da atividade de investigação particular, desde antanho previam o fornecimento, inclusive obrigatório, de informações por parte do Detetive Profissional à Autoridade Policial sempre que requisitado a tanto (vide artigo 5º., da Lei 3.099/57 e artigo 5º. e 7º. , do Decreto Federal 50.532/16); que desde que não haja ilicitude na obtenção da prova, mesmo aquelas colhidas antes do advento da Lei 13.432/17 por investigação particular, poderão ser aproveitadas normalmente numa investigação criminal e, posteriormente, num processo penal; que antes da Lei 13.432/17 os Detetives Particulares já atuavam no Brasil com base na Lei 3.099/57 e no Decreto Federal 50.532/61, os quais, aliás, não foram revogados pela novel legislação e lhe servem de complemento naquilo que não haja conflito; que nem antes, nem mesmo agora, tem o Detetive Particular poder para notificar pessoas, conduzir coercitivamente, postular ou representar por buscas e apreensões, interceptações telefônicas, quebras de sigilo etc.; que sem tais limitações e diante do artigo 14, CPP e da Lei 3.099/57 e Decreto Federal 50.532/61, estava implícita uma autorização de atuação, dentro daquilo que pode um particular fazer, em termos de apuração criminal, sem usurpar função pública exclusiva. Mesmo porque se aventava a possibilidade de que tais profissionais fornecessem tudo quanto apurassem sempre que requisitados pela Autoridade Policial; que se antes era possível recepcionar informes colhidos sobre investigação criminal por Detetive Particular sem autorização prévia do Delegado de Polícia ou de outra autoridade pública encarregada da presidência da investigação criminal, isso claramente não é mais admissível por força do Parágrafo Único do artigo 5º., da Lei 13.432/17. Agora a autorização do Delegado de Polícia, por exemplo, no bojo do Inquérito Policial, é imprescindível como elemento de legitimação da prova colhida por Detetive Particular. Realizada de outro modo, constitui violação frontal da lei de regência. Sob esse aspecto trata-se de “prova ilegítima”, pois que viola norma de caráter processual. No entanto, tendo em vista o dispositivo limitador em discussão, a prova colhida pelo Detetive Profissional, com omissão de requerimento de atuação ao Delegado de Polícia ou em contradição à sua rejeição, constitui também “prova ilícita”, pois é produzida com violação de direito material penal (Usurpação de Função Pública Qualificada – artigo 328, Parágrafo Único, CP, eis que o Detetive Particular cobra honorários) e constitucional (por infração ao disposto no artigo 144, §§ 1º e 4º., CF). Sem a autorização do Delegado ou contra sua rejeição por este no Inquérito Policial, por exemplo, o Detetive atua de forma ilegítima e ilícita. Se por um lado ele tem autorização legal para atuar, dentro das regras estabelecidas, fora destas, obviamente, incide em atuação ilegal; que dessa forma, as provas por ele obtidas são inadmissíveis no processo, assim como aquelas que delas derivarem diretamente, nos termos do artigo 5º., LVI, CF c/c artigo 157 e seu § 1º., CPP).
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