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Na prática, nulidade processual é um fingimento, e não efetiva garantia - 24/11/2017
Na prática, nulidade processual é um fingimento, e não efetiva garantia (A doutrina tradicional respalda aquilo que se conhece por pas de nullité sans grief. Acompanhada pelo STF e STJ, conclui que eventual “defeito” ou “vício” na forma prevista em lei causa apenas a “irregularidade” do ato, mas que tal “irregularidade” não pode ser confundida com “nulidade”, já que esta não é da “essência” do ato, e sim uma “consequência” (sanção) jurídica a ser construída, nas hipóteses taxativas autorizadas por lei, pelo raciocínio “discricionário” do magistrado, o qual deve examinar, por um lado, se a “finalidade” para o qual o ato se destina foi alcançada, e, por outro, em caso positivo, se o alcance “irregular” de tal finalidade/conteúdo importou genuíno “prejuízo” à parte que pretende a invalidação — e isso, frise-se bem, independentemente de se tratar de nulidade “relativa” ou de nulidade “absoluta”; Seja como for, para o que me interessa mais de perto neste artigo, insta salientar que a interpretação alargada, absoluta e acrítica que se tem dado ao artigo 563 do CPP[iii], mormente no que diz respeito à equiparação de nulidade relativa e absoluta quanto à necessidade de comprovação de prejuízo, ajusta-se concomitantemente a dois eficientes predadores da ampla defesa e da paridade de armas: poder discricionário e prova diabólica. Veja-se bem: no âmbito do processo penal[iv], o modelo da “forma como instrumento” pode até, em certa medida, ser compatível e coerente com a leitura isolada do mencionado dispositivo legal. Todavia, do ponto de vista constitucional, seria salutar, se não a completa modificação de lege ferenda de todo o sistema de nulidades (mais ou menos na linha proposta por Ricardo Gloeckner e Aury Lopes Jr.), ao menos o retorno à interpretação jurisprudencial restritiva do artigo 563 do CPP, a fim de ressuscitar a ideia de presunção de prejuízo nas nulidades absolutas; Os princípios acusatório e do devido processo legal demandam que a aplicação dos efeitos jurídicos de uma fraude contra as formas processuais independa dos sentimentos que os fatos narrados na denúncia despertam na consciência do magistrado. Trata-se da técnica interpretativa que Jeremy Waldron, em excelente metáfora, nominou “engolir a seco”: o bom juiz, sabedor de sua responsabilidade política e do dever constitucional de imparcialidade, reconhece e declara um desrespeito às regras do jogo processual ainda que se sinta intimamente escandalizado com a gravidade dos fatos apurados, ou ainda que desprestígio e impopularidade sejam as consequências ante a opinião pública; Não obstante, as distinções analíticas enaltecidas no modelo da “forma como instrumento” incentivam justamente o oposto: que o jogo processual continue a fluir, rendido às opiniões do julgador acerca da gravidade do crime ou da decência do réu, ou, enfim, à influência exercida por jogadores extra-processuais que clamam por punição. Na leitura ampla do artigo 563 do CPP, toda a estrutura do pas de nullité sans grief é pensada com o intuito, ainda que disfarçado, de abrir discricionariedade onde o sistema jurídico-constitucional determina o seu radical fechamento, de capitalizar confiança no aplicador do direito onde se pressupõe justamente desconfiança e rígidos limites normativos; Trata-se de um elogio ao mau juiz, uma ode àquele funcionário do sistema que, escravo das emoções galopantes, não consegue contrariar-se a si próprio em favor da aplicação da mensagem objetivamente passada pelo direito. O poder discricionário que o pas de nullité sans grief enfeixa no magistrado é brutal, imperturbável, e confere ares de legitimidade a qualquer escolha, desde que a decisão atenda ao frouxo teste da motivação razoável: cabe a ele selecionar se se trata de ato “meramente irregular”, de “nulidade relativa” ou de “nulidade absoluta” e, em qualquer dos casos, avaliar, por sua conta e risco, se a parte conseguiu “demonstrar o prejuízo”; Isso nos conduz ao segundo predador da due process clause: a exigência de que a parte faça prova de algo impossível ou difícil de ser provado. Ou, ainda, em termos contemporâneos, que prove algo cujo prejuízo, diante da normativa constitucional, deveria ser juridicamente presumido; A combinação entre o modelo alargado de pas de nullité sans grief e o gerenciamento viciado de poder discricionário adorna o pior cenário possível para a defesa; Na prática do processo penal brasileiro, basta que a reação emotiva do julgador aos fatos narrados na denúncia hostilize-se desde logo contra a figura do réu para que nenhum argumento, explicação ou evidência alcance força suficiente para a anulação de um ato processual irregular. No modelo ampliado da “instrumentalidade das formas”, que obriga o acusado a suplicar pelo fair play e torcer pela boa vontade do juiz mesmo nas nulidades absolutas, o instituto da “nulidade processual” tem a natureza jurídica de lorota, de fingimento, e não de efetiva garantia contra o jogo sujo) https://www.conjur.com.br/2017-nov-24/bruno-torrano-pratica-nulidade-processual-nao-garantia?utm_source=dlvr.it&utm_medium=facebook