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IMPORTUNAÇÃO SEXUAL OU ESTUPRO DE VULNERÁVEL. VIOLÊNCIAS SEXUAIS E O ATUAL ENTENDIMENTO DO STF - 10/07/2020
IMPORTUNAÇÃO SEXUAL OU ESTUPRO DE VULNERÁVEL. VIOLÊNCIAS SEXUAIS E O ATUAL ENTENDIMENTO DO STF (Em recente julgado, datado de 01/10/2019, o Supremo Tribunal Federal se manifestou acerca do possível alcance do tipo penal previsto no artigo 215-A do Código Penal[1], conhecido como importunação sexual, inserido no ordenamento jurídico pela Lei 13.718/2018, em situações envolvendo vulneráveis; Trata-se de decisão inédita no tribunal, que pode servir de fundamento para que os demais tribunais do país se abstenham de desclassificar para esse delito condutas imputadas como estupro de vulnerável; Assim, o presente artigo pretende discutir os principais argumentos levantados pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal em sede do Habeas Corpus 134.591/SP[2], articulando com o que pesquisas no campo das violências sexuais têm debatido sobre a temática; A Primeira Vara Criminal da Comarca de Igarapava/SP condenou um homem a oito anos de reclusão por estupro de vulnerável (artigo 217-A do Código Penal[3]), por ter beijado, com inserção da língua, a boca de uma criança de cinco anos de idade; A defesa do réu apelou ao Tribunal de Justiça, postulando absolvição por falta de provas. Sucessivamente, buscou a desclassificação do delito para a contravenção penal prevista no artigo 61 do Decreto-Lei nº 3.688/1941 (“Importunar alguém, em lugar público ou acessivel ao público, de modo ofensivo ao pudor”), posteriormente revogada pela mesma lei que tipificou a importunação sexual; O juízo de segundo grau determinou a desclassificação para contravenção penal diversa, prevista no artigo 65 da Lei de Contravenções Penais (“Molestar alguém ou perturbar-lhe a tranquilidade, por acinte ou por motivo reprovável”), ainda em vigor; Diante disso, o Ministério Público interpôs recurso especial no Superior Tribunal de Justiça, buscando o restabelecimento da condenação em primeira instância por estupro de vulnerável; O recurso foi provido por decisão monocrática, mantida pela Sexta Turma do STJ após agravo da defesa; Em sede de habeas corpus, o acusado/impetrante pleiteou ao STF a suspensão liminar dos efeitos da condenação e o restabelecimento do acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo; O Ministro Marco Aurélio, relator do processo, acolheu o pedido liminar para suspender os efeitos da condenação até o julgamento do mérito do writ, em 23/11/2016; De antemão, e para não fazer suspense ao leitor mais ansioso, a Turma julgadora, em 01/10/2019, por maioria, revogou a medida liminar anteriormente deferida e indeferiu no mérito a ordem de habeas corpus, com o entendimento de que a conduta descrita se amolda às elementares do estupro de vulnerável; Os embargos de declaração interpostos contra a decisão foram rejeitados unanimemente, em 27/04/2020, e determinada a “certificação do trânsito em julgado e arquivamento imediato dos autos”.[4]; O julgamento do mérito se iniciou em 27/06/2017, portanto antes da tipificação da importunação sexual, oportunidade em que o Relator Ministro Marco Aurélio confirmou o entendimento manifestado na decisão liminar e proferiu seu voto para conceder a ordem e “restabelecer o entendimento constante do acórdão prolatado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, desclassificando a conduta do paciente para a versada no artigo 65 do Decreto-lei nº 3.688/1941”; Seu posicionamento encontrou resistência em outros ministros, manifestada naquela sessão pelo Ministro Alexandre de Moraes, circunscrevendo-se a divergência inicial na possibilidade ou não de desclassificação do crime de estupro de vulnerável para a contravenção penal de “molestação”, cuja pena já se encontrava inclusive prescrita quando da condenação. O Ministro Luís Roberto Barroso pediu vista; Porém, quando os autos foram novamente levados a sessão de julgamento, em 18/12/2018, havia entrado em vigor a Lei 13.718/2018, de 24/09/2018, que tipificou a importunação sexual, modificando-se a discussão – a partir do voto-vista do Ministro Roberto Barroso, ao qual aderiu o Relator –, para a possibilidade de aplicação do “crime intermediário”; Merece ser destacado que, para além da análise dogmática acerca da tipicidade dos fatos imputados, existe uma questão de fundo, que se depreende dos argumentos levantados pelos ministros, referente à valoração da quantidade de pena a ser aplicada a um caso em que se questiona a gravidade da conduta que afronta a dignidade sexual de uma pessoa. Ou seja, o que também esteve em debate pelos ministros foi se o beijo dado em uma criança de cinco anos de idade é grave o suficiente para ensejar uma pena de oito anos. Ou, ao contrário, se se trata de uma conduta reprovável, mas não passível de sanção tão severa quanto a estipulada no crime de estupro de vulnerável, sendo, nessa lógica, necessário lançar mão de uma sanção mais branda; Sobre o crime de importunação sexual cabe uma breve explicação sobre o seu contexto de surgimento. Como menciona o Ministro Alexandre de Moraes em seu voto, trata-se de um tipo penal que foi aprovado às pressas pelo Congresso Nacional em decorrência da repercussão da prisão em flagrante de um homem em São Paulo, o qual, reiteradamente, entrava em ônibus públicos, roçava o seu pênis em passageiras desacordas ou se masturbava e, em seguida, ejaculava em cima delas; No que se refere às principais teses debatidas no acórdão, merece atenção o argumento do Ministro Alexandre de Moraes – cujo voto vencedor foi acompanhado pelos Ministros Luiz Fux e Rosa Weber, sendo vencidos os Ministros Luís Roberto Barroso e Marco Aurélio –, destacando que o estupro de vulnerável se caracteriza em função de uma violência que é sempre presumida em relação a incapazes. Desse modo, os elementos do tipo do artigo 217-A do CP estariam presentes, já que beijar uma criança de cinco anos, introjetando a língua em sua boca, “é questão de poder, é questão de imposição a força”. Moraes foi o único ministro a enfatizar que os crimes sexuais decorrem de relações de poder e de dominação e que, quando cometidos contra menores de catorze anos, não há que se falar de anuência ou falta dela, pois este elemento não deve ser considerado; Ainda, pontuou que mesmo o laudo psicológico não tendo indicado danos à vítima, crimes sexuais contra crianças e adolescentes muitas vezes só vão desencadear traumas após um longo período. Inclusive, é possível afirmar, na esteira do argumento do ministro, que os traumas podem se manifestar quando a vítima passa a ter consciência de que foi violentada, mediante um repertório de significações construído na fase de maior maturidade; Já o Ministro Barroso defendeu a tese da necessidade de encontrar um meio termo para a condenação, ao considerar que mesmo em se tratando de uma conduta reprovável, o tipo do artigo 217-A do CP não distinguiria condutas mais ou menos invasivas, de modo que seria adequado que o caminho do meio termo fosse tomado pelo STF, sendo cabível ao caso o tipo do artigo 215-A. Insistiu que a pena de oito anos aplicada ao acusado é severa demais, tendo em vista ser réu primário e de bons antecedentes; O Ministro Luiz Fux pediu vista, tendo apresentado seu voto na sessão de julgamento do dia 01/10/2019, acompanhando a divergência do Ministro Alexandre de Moraes. A Ministra Rosa Weber também votou no mesmo sentido, encerrando o debate, com uma maioria de três ministros; O voto do Ministro Fux afirma a necessidade de trazer para a análise da questão a previsão constitucional do compromisso absolutamente prioritário da família, da sociedade e do Estado com a preservação da dignidade, inclusive sexual, das crianças e adolescentes, consoante o artigo 227, caput, da Constituição da República. Com base nesta perspectiva, afirmou que o poder público precisa agir para reprimir severamente tais tipos de violência) https://emporiododireito.com.br/leitura/importunacao-sexual-ou-estupro-de-vulneravel-violencias-sexuais-e-o-atual-entendimento-do-stf?fbclid=IwAR1Z5-Vu44DIxtY7mlY7sjCF0i7Krlwo7abAZDDLVr1adIVm4c0SuCVm6PE