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Dolo não é somente e qualquer intenção de fazer algo - 14/05/2018

Dolo não é somente e qualquer intenção de fazer algo (Pode alguém, em sã consciência, querer e, ao mesmo tempo, não querer algo que realiza?; É possível, sem maltrato à dogmática jurídico-penal, afirmar-se o tipo penal subjetivo, sem que — antes e induvidosamente — se dê pela presença do correlato tipo penal objetivo? Dito de outro modo, pode-se falar em dolo em fato objetivamente atípico?; 1ª) pode-se falar que alguém, ao merendar, tem dolo de comer um bolo?; 2ª) Ou que alguém teve dolo de ir à praia e, por isso, foi?; 3ª) Ou, ainda, que no momento em que lê este texto o leitor tem dolo de fazê-lo?; A resposta negativa se impõe; Isto porque, desdobrado o tipo penal em tipo penal objetivo e tipo penal subjetivo, a negação do primeiro (nas situações acima, os três fatos — 'comer bolo'; 'ir à praia' e 'ler um texto' — são objetivamente atípicos) é conducente a que se tenha por prejudicada a verificação do segundo, visto se afigurar o dolo como conceito eminentemente jurídico, e não psicológico, consistindo, prima facie, no querer[2] o agente, ao atuar, a realização de fato que preenche tipo penal objetivo, com ciência de todos os elementos desse mesmo tipo penal objetivo, o qual efetivamente logra realizar, seja perfeita (consumação), seja imperfeitamente (tentativa); Não se pode, pois, matar dolosamente alguém, sem que: primeiro, se saiba que se pratica a conduta contra alguém, com possibilidade de morrer e, por isso, vivo; e, segundo, que a conduta seja direcionada — juridicamente — à realização da morte desse alguém (atuação para a morte, em que coincidem 'querer psicológico' e 'querer jurídico', ou atuação apesar da morte, em que ausente o 'querer psicológico', mas presente — e é o que importa para juridicamente se afirmar o dolo — 'o querer jurídico'[3]); Incorreu, pois, o legislador em equívoco ao utilizar as expressões: 'Não se pune a tentativa'; 'Se o suicídio se consuma' e 'Se da tentativa de suicídio'; a primeira, no caput do artigo 17, e, as duas últimas, no preceito secundário do tipo penal do artigo 122, ambos do Código Penal, já que referidas expressões detêm significado técnico-jurídico, não se podendo cogitar de tentativa, e muito menos de consumação, em fato objetivamente atípico. Em verdade, crime impossível e suicídio não apresentam tipicidade penal; Miguel Reale Jr, acerca da incompatibilidade entre tentativa e crime impossível, afirma: “Enquanto no crime tentado a consumação deixa de ocorrer pela interferência de causa alheia à vontade do agente, no crime impossível a consumação jamais ocorrerá, e, assim sendo, a ação não se configura como tentativa do crime, que se pretendia cometer, por ausência de tipicidade. (…). No crime impossível, são os próprios meios de que se serve o agente ou o objeto material sobre o qual faz recair sua ação que tornam impossível o crime. Não chega a haver tentativa de crime, pois esta pressupõe a utilização de meios idôneos e obviamente também, a existência de objeto material”[7]; Se, no crime impossível, não há tipicidade penal objetiva, como se falar em dolo de matar um morto?; No molde da teoria da imputação objetiva, na hipótese de se atirar, com intenção de matar, em um morto, cuja morte se desconhecesse, haveria a criação ou incremento de risco ao bem jurídico protegido, a saber, a vida humana? Por óbvio, não. Em verdade, sequer existiria vida, como bem jurídico-penal a se tutelar. Negada, pois, a imputação objetiva, não há que se falar, por prejudicada, em correlata imputação subjetiva, fase subsequente à afirmação da imputação objetiva do resultado — como concretização do risco produzido — à conduta praticada; Ainda, imagine-se que alguém desenvolva velocidade excessiva em seu veículo, em via urbana, para não perder a hora na faculdade. Havendo inobservado o dever de cuidado, não se lhe pode imputar haver atuado com culpa (elemento normativo/subjetivo do tipo penal), à míngua da causação, por exemplo, de lesão corporal (em) ou morte (de) alguém. Houve imprudência, sim, mas não a realização de tipo penal objetivo culposo, circunstância que, ao fim, obsta a verificação do elemento normativo/subjetivo do tipo penal: culpa; Se não há culpa, sem tipo penal objetivo, por que, no mesmo contexto, haveria dolo?; No pertinente, Américo Taipa de Carvalho ensina que: “Para haver crime doloso é necessário que a componente ou dimensão objectiva do facto típico seja abrangida pelo dolo do respectivo agente. Daqui a designação de dolo do facto, dolo do tipo ou dolo da factualidade típica para significar esta exigência do conhecimento das características ou elementos do facto descrito no tipo legal, e a vontade de realizar este facto”[8] (destaques por acréscimo); A esta altura, existe lastro para resposta ao segundo questionamento deste texto: Não. Não se pode falar, “sem assassinar a lógica”[11] jurídico-penal, em dolo em fato objetivamente atípico[12]; Com efeito, dolo não é (qualquer) intenção, mas, em uma de suas formas (classificações), é intenção qualificada pela realização — perfeita (consumação) ou imperfeita (tentativa) — de fato juridicamente querido (na intenção ou dolo direto de primeiro grau, se confundem vontade jurídica — a única necessária e suficiente para o dolo — e vontade psicológica), que preenche um tipo penal objetivo; Acertado, pois, o emprego na redação do artigo 18, inciso I, do Código Penal dos verbos querer e assumir no tempo passado: “Art. 18 – Diz-se o crime: I – doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo”.; Isto porque dolo é imputação que somente se faz, após a prática do fato e desde que o fato praticado preencha a moldura de um tipo penal objetivo; Consistindo em imputação pós-fato, o dolo detém ainda a característica da referibilidade, já que deve, necessariamente, consistir em imputação referida ao momento da prática do fato objetivamente típico; Assim, praticado o fato — e constatada sua tipicidade penal objetiva — somente então se poderá avaliar se sua realização ocorreu dolosa ou culposamente, ou, ainda, se ocorreu causação, a um só tempo, sem dolo e sem culpa[13]; Apresentado o dolo como vontade — normativa e consciente — realizadora de (que realizou, perfeita ou imperfeitamente) fato objetivamente típico, destacam-se seus elementos: vontade e consciência; A vontade é manifesta na própria decisão de agir. Com efeito, a decisão humana de atuar — para o crime ou apesar do crime — não é autômata, necessitando de escolha, de opção, enfim, de decisão do agente, consciente das circunstâncias e consequências daquilo que faz. Assim, a representação das circunstâncias e consequências do agir atuaria — uma vez realizada a ação[15] — como mecanismo de estímulo ou de não inibição da atuação encetada; Havendo o agente representado o fato, em sua completa dimensão de circunstâncias e consequências, dois caminhos se lhe apresentam: agir ou não agir. Agindo, quer — normativa ou juridicamente — o fato, e, somente se não agir, evidenciará sua decisão (querer jurídico) contrária ao representado fato objetivamente típico; Chegada, pois, a hora da resposta ao primeiro questionamento-base deste texto: alguém, em sã consciência, somente poderia dizer 'quero e não quero' a algo que realiza, se manifestado o 'sim' como querer jurídico e o 'não' ao querer psicológico; Pense-se na seguinte hipótese: Jonas, apaixonado, quer muito casar com Marta. No entanto, não quer a mãe de Marta, Mara, como sogra. Duas opções se lhe apresentam: a primeira — casar com Marta, manifestando seu querer psicológico à noiva, e aceitar, embora lamentando, Mara como sogra, manifestando, então, seu querer jurídico à mãe da noiva; e a segunda — não casar com Marta, perdendo então o grande amor de sua vida, por dar relevo a seu não querer psicológico de ter Mara como sogra; Na hipótese, que se aproxima do chamado dolo direto de 2º grau (fosse objetivamente típico o fato de ter Mara como sogra), noiva e sogra, por intimamente ligadas, vêm em um só pacote, que, representado como um todo, pode ser, ou não — normativa ou juridicamente — querido; Em arremate: o “quero sim e quero não” — à margem da arte, que, como a necessidade, não obedece a leis — somente é possível se presentes, em relação a algo que se realiza, o querer normativo ou jurídico que diz 'quero sim' e o (não) querer psicológico que emenda 'quero não'; Ao fim, uma noção (sem foro de definitividade) de dolo: diz-se dolosa a atuação consciente que realizou, perfeita (consumação) ou imperfeitamente (tentativa), um fato normativa ou juridicamente querido, que preenche um tipo penal objetivo) https://www.conjur.com.br/2018-mai-13/jose-osterno-dolo-nao-somente-qualquer-intencao-algo?utm_source=dlvr.it&utm_medium=facebook
Autor: Mattosinho Advocacia Criminal

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