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Disparidade de armas e o supremo poder da acusação - 05/01/2019
Disparidade de armas e o supremo poder da acusação (No âmbito do Júri brasileiro existe uma imperdoável e desarrazoada disparidade de armas; no âmbito do Júri brasileiro, a acusação ostenta (por intermédio de equivocada interpretação sobre as regras do jogo) de um poder supremo; no Júri pátrio, tem-se entendido, grosso modo, que a acusação manda e que os Defensores devem “obediência” a ela; no Júri brasileiro, não há isonomia e garantia substancial, efetiva e material do direito fundamental ao contraditório (Art. 5º, LV), muito menos da plenitude defensiva (Art. 5º, XXXVIII, alínea “a”, da CF); Isso tudo por quê? Pois: ilegalmente, entende-se que a Defesa somente pode exercer a tréplica, se a acusação optar, dentro de seus critérios de conveniência e oportunidade, dentro de sua discricionariedade (como se fosse um patrão que mandasse no subordinado), ir à réplica; Não senhoras, não senhores! A Defesa, primeiramente, não deve – nunca deveu e nunca deverá – obediência ao Órgão Acusatório. Consta na Lei n.º 8. 906/1994 (Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil), em seu artigo 6º, que não há “hierarquia nem subordinação entre advogados, magistrados e membros do Ministério Público.”; A toda evidência, se o Ministério Público, com toda sua autonomia, opta por não usufruir da réplica, trata-se de uma escolha do Órgão Acusatório que não pode repercutir sobre a Defesa; Dito de outro modo: se a acusação não deseja utilizar da réplica, a defesa não pode ser cerceada e prejudicada por uma decisão do Parquet, mormente porque o desinteresse na réplica significa somente que a acusação está assumindo os riscos e as consequências de não usufruir de uma oportunidade processual dela (da acusação); Assim, a oportunidade processual defensiva, de exercer a tréplica, não pode ser atingida pela negativa da réplica. Inicialmente, porque não há subordinação entre Advogados e Promotores de Justiça, tampouco hierarquia. O Defensor não pode, na defesa de uma liberdade humana no plenário de júri, estar subordinado, vinculado e adstrito à uma opção acusatória; Em segundo lugar, inconcebível que a defesa seja restringida por incoerência gramatical. Com efeito, o artigo 476, §4º, do Código de Processo Penal, dispõe que: § 4o A acusação poderá replicar e a defesa treplicar, sendo admitida a reinquirição de testemunha já ouvida em plenário; A legislação processual pátria, em nenhum momento, prevê que a tréplica restará prejudicada acaso a acusação não utilize da réplica. A tréplica somente se chama tréplica porque a Defesa sempre tem a palavra por último e, portanto, por uma questão lógica, o que vem antes, enquanto oportunidade processual da acusação, chama-se réplica; Agora, se a acusação não tem interesse na réplica, trata-se, repisa-se, de uma opção acusatória (não raras vezes, a negativa é eloquente per si) cujas consequências devem estar adstritas somente ao Órgão de acusação. A tréplica não deixa de existir porque a parte não utilizou da réplica. Isso se chama cerceamento de defesa, má-fé e contorcionismo gramatical. Novamente: não há subordinação, nem vinculação entre Acusador e Defensor; Como decorrência dos princípios da isonomia e paridade de armas, às partes devem ser garantidas as mesmas chances e oportunidades. Se a acusação tem a chance de ir à réplica e ela não vai, houve uma perda de oportunidade; igualmente, se o Estado assegurou à acusação a possibilidade de ir à réplica (não importando se ela utilizou deste direito ou não), deve-se assegurar à defesa a chance de ir à tréplica e utilizar desta oportunidade processual; Veja-se que, no atual entendimento, o MInistério Público não determina somente se existirá réplica; o Ministério Público determina se haverá a réplica e a tréplica!; Eis o processo penal brasileiro: onde a acusação determina o que pode ou não a defesa fazer; um processo penal onde a acusação tem a faculdade, a discricionariedade, o poder (indevidamente atribuído) de decidir quando a defesa poderá falar mais ou não; um processo penal onde a acusação fala pela defesa; e a defesa não fala por si; Que processo penal é esse? Do autoritarismo, da desproporcionalidade? Ou da paridade de armas, da isonomia (com igualdade de chances e oportunidades, sem a existência de subordinação e hierarquia entre as partes)? E a plenitude de defesa? Qual o seu significado no processo penal? E quando o Defensor quer utilizar da tréplica porque essencial para a explanação completa, plena, da tese defensiva, mas não pode porque a acusação disse não…? E se o veredicto for condenatório? Houve garantia do contraditório e da plenitude defensiva, mormente considerando que a defesa não pôde se manifestar e defender o acusado no tempo que deveria ser assegurado, esgotando os esforços, argumentos e teses defensivas? Percebam a incongruência: para restringir uma liberdade, entende-se que há este poder soberano nas mãos do acusador, porém, para protegê-la, para salvaguardar o direito de ir e vir e o destino de uma vida humana (do réu), o defensor não tem este – mesmo, idêntico! – poder soberano; Logo, não restam dúvidas: o processo penal brasileiro não é vislumbrado como garantia, senão como um mecanismo à serviço do Poder Punitivo; Neste sentido, com a maestria que lhe é peculiar, o escólio de Jader Marques (2016), no qual destaca, inclusive, que o simples “não” da acusação em ir à réplica já constitui manifestação eloquente, perante os jurados, de que o processo está pronto para ser julgado conforme deseja a acusação: Constitui vantagem indevida para a acusação o simples fato de o acusador já saber, desde o início dos debates, como dirigir sua sustentação, pois pode contar ou não com a ampliação do tempo, diante da faculdade de usar a réplica. (…); É inegável a possibilidade de manipulação antiética do tempo de debate (…); O simples ‘não’ da acusação à pergunta do juiz sobre o desejo de usar a réplica, simbolicamente, representa uma manifestação eloquente da postura do órgão acusador sobre o andamento dos trabalhos no Júri e representa, de certa maneira, uma burla à lógica do processo penal de que a defesa deva falar por último. Quando a acusação dispensa a réplica, calando a defesa, deixa marcado aos membros leigos do conselho de sentença que o processo está pronto para julgamento na visão de quem fez a imputação; E o interesse da defesa, tem importância? O processo está pronto para julgamento na visão do defensor? Há uma situação (indevida) de superioridade de quem acusa, incompatível com a ideia de um processo penal fundado na paridade de armas, na igualdade das partes, no equilíbrio das forças; Se indeferida a tréplica, é dever nosso, da Advocacia Criminal brasileira, consignar em ata e guerrear pelo respeito ao devido processo legal, notadamente porque o indeferimento da tréplica caracteriza ofensa ao artigo 8.2, “c”, do Pacto de São José da Costa Rica, que prevê que deve ser garantido ao acusado a “concessão do tempo e dos meios adequados para a preparação de sua defesa.”) https://canalcienciascriminais.com.br/supremo-poder-da-acusacao/?fbclid=IwAR3hIUCeEUvCL5t20706zOE_NZWMfu0zUiK8lNOr9g5a6PZazttWDs9amX0