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Configuração de abuso de autoridade exige animus abutendi - 30/06/2020
Configuração de abuso de autoridade exige animus abutendi (O elemento subjetivo geral no abuso de autoridade é o dolo. Não há previsão legal de abuso de autoridade culposo. Entretanto, logo no seu artigo inaugural a lei evidencia que o dolo, por si só, não é suficiente para que o crime se perfaça. Além da consciência (elemento cognitivo) e da vontade (elemento volitivo) que compõem o dolo, é preciso algo a mais, uma finalidade específica que deve animar a conduta do agente. Vejamos o dispositivo:Art. 1º. (...). § 1º As condutas descritas nesta Lei constituem crime de abuso de autoridade quando praticadas pelo agente com a finalidade específica de prejudicar outrem ou beneficiar a si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, por mero capricho ou satisfação pessoal. § 2º A divergência na interpretação de lei ou na avaliação de fatos e provas não configura abuso de autoridade; Além da consciência e da vontade de realizar as condutas descritas na lei, o agente público deve agir com a finalidade específica (elemento subjetivo especial) de, alternativamente (Art. 1º, §1º): a) prejudicar outrem; b) beneficiar a si mesmo ou a terceiro; c) por mero capricho; d) por satisfação pessoal; Prejuízo é o dano, a perda. Benefício é a vantagem, o ganho. Podem ser de qualquer natureza. Evidente que o prejuízo ou benefício devem extrapolar o exercício regular das funções do agente público. Todavia, também previu o legislador como elemento subjetivo específico, alternativamente, o mero capricho ou satisfação pessoal, que constituem expressões vagas, de alto grau de subjetividade; Capricho é a cisma, a vontade birrenta ou arbitrária, o desejo injustificado. Satisfação pessoal é o sentimento de prazer, regozijo. Claro que o agente público vocacionado experimenta certa satisfação ao cumprir seu dever; o que a lei pune não é o advento dessa satisfação após cumprir sua missão buscando o interesse público, mas agir objetivando ab initio o deleite individual, transformando a consequência em causa.3 Assim agindo, coloca seu interesse particular acima do interesse público, como por exemplo quando atua com desiderato de autopromoção ou endeusamento de sua imagem.4; Esse elemento subjetivo específico do tipo não precisa efetivamente se concretizar, bastando que exista na mente do autor, ou seja, é suficiente que a conduta do agente seja orientada por essa particular motivação, que deve ser demonstrada com base em elementos objetivos do caso concreto. Aliás, caso a acusação não demonstre expressamente na peça inaugural essa finalidade especial que anima o agente, a denúncia ou queixa será inepta e deverá ser rejeitada (Art. 395, I, do CPP), por impossibilitar ao réu o exercício de seu direito de defesa; Esse elemento subjetivo especial que anima a vontade do agente e que deve permear todas as condutas criminosas é rotulado como animus abutendi. A exigência de um dolo e de mais um requisito subjetivo que o transcende dificulta a incidência dos tipos penais da Lei de Abuso de Autoridade; Um ponto que precisa ficar acentuado é que em havendo conflito entre o elemento subjetivo especial reclamado pelo tipo penal e aqueles previstos no Art. 1º, §1º, deve preponderar o primeiro. Em sendo possível a compatibilização entre os dois, ambos deverão ser comprovados no caso concreto; Claro que paira sobre a conduta do agente a presunção (relativa) de boa-fé, cabendo àquele que pretende desconstituí-la o ônus de demonstrar a má-fé por meio de elementos concretos e não meras suposições (v.g., de que estaria o agente atuando de forma arbitrária ou por puro prazer); Obviamente, esse especial fim do agente não se presume, nem se deduz, e deverá ser demonstrado por prova inequívoca. As hipóteses, principalmente as de “por mero capricho ou satisfação pessoal” somente poderão ser comprovadas pela admissão da própria autoridade ou por testemunha que dela tenha ouvido tal relato, sendo impossível de ser demonstradas por raciocínio dedutivo.5; Portanto, não comete abuso de autoridade o agente que errar ou atuar com desídia, sendo incorreto concluir que a preguiça ou o equívoco equivalem à má-fé; A norma evidencia que a divergência na interpretação de lei ou na avaliação de fatos e provas não configura abuso de autoridade (Art. 1º, §2º). Veda-se o crime de hermenêutica. A natureza jurídica desse dispositivo é de causa excludente do elemento subjetivo (dolo), pois se no caso há apenas discordância na análise da norma, do fato ou da prova, é sinal de que o agente não atuou para causar benefício ou prejuízo, ou por capricho ou satisfação pessoal. Fosse uma excludente de ilicitude, teríamos que admitir que o sujeito, pelo tão só fato de pensar juridicamente de modo diverso, praticaria fato típico com fim específico exigido pelo tipo (beneficiar, prejudicar, capricho ou satisfação pessoal). A própria localização topográfica da norma (abaixo do elemento subjetivo) confirma que se trata de excludente da finalidade específica; Excepcionalmente existem limitações à interpretação. É o que ocorre diante de súmula vinculante, não podendo o agente público simplesmente ignorar seu comando sob a justificativa de estar realizando atividade hermenêutica.6 Nessa linha, a causa de atipicidade não alberga interpretações absurdas e teratológicas, que pretendam subverter o sentido óbvio das palavras; Não se vislumbra compatibilidade com o dolo eventual, pois a finalidade específica exigida do agente só pode ser atingida com vontade, e não com mera assunção do risco de atingir o resultado.7; Da mesma forma que se exige justa causa para se iniciar qualquer investigação, sob pena de crime do Art. 27 da Lei 13.869/19, exige-se justa causa também para que juízes, promotores e delegados sejam representados por abuso de autoridade. A representação leviana por abuso de autoridade pode ensejar responsabilização criminal por comunicação falsa de crime (comunicar crime que não se verificou - Art. 340 do CP) ou denunciação caluniosa (dar causa à instauração de investigação contra inocente - Art. 339 do CP); Diga-se, por fim, que assim como a injúria ao juiz não acarreta sua suspeição (Art. 256 do CPP), a representação indevida por abuso de autoridade não tem o condão de acarretar a suspeição do agente público. Isso para evitar que alguém consiga por ato unilateral afastar a autoridade que não seja mais conveniente a seus interesses, impedindo que o autor da artimanha se beneficie da própria torpeza) https://www.conjur.com.br/2020-jun-30/academia-policia-configuracao-abuso-autoridade-exige-animus-abutendi?utm_source=dlvr.it&utm_medium=facebook