Você tem garantias e direitos, portanto, conte com o seu Advogado de confiança para defendê-lo (a)
Notícias
Artigos
Análise acerca da (in) aplicabilidade do princípio da co-culpabilidade face a aplicação da pena - 26/06/2020
Análise acerca da (in) aplicabilidade do princípio da co-culpabilidade face a aplicação da pena (Como expresso no Art. 59 do Código Penal: O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime; No ordenamento jurídico brasileiro, a aplicação da pena está prevista no capítulo III do Código Penal, sendo adotado o sistema trifásico, como prescrito no Art. 68, ‘’a pena base será fixada atendendo-se ao critério do Art. 59 deste Código; em seguida, serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento.’’; A coculpabilidade surge como um princípio que estabelece a divisão da responsabilidade entre o indivíduo que comete a prática criminosa e o Estado/sociedade, em circunstâncias que comprovam que as falhas estatais fatalmente acarretaram o cometimento do fato criminoso: para esses indivíduos, o âmbito de determinação é diminuído em razão das suas condições econômicas e sociais; Verifica-se que a jurisprudência tem invocado o princípio da coculpabilidade. Todavia, ainda é tema que causa divergência no ordenamento jurídico, havendo resistência clara em sua aplicação. Vejamos um exemplo em que o princípio foi invocado: APELAÇÃO – FURTO – PROVAS SUFICIENTES DA AUTORIA E MATERIALIDADE – CONDENAÇÃO MANTIDA – INVOCAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CO-CULPABILIDADE – NÃO APLICABILIDADE DE PENA EXACERBADA – DIMINUIÇÃO DA PENA BASE – AUMENTO MÁXIMO DE 1/6 SOBRE A PENA BASE. É de se reconhecer as circunstâncias atenuantes inominadas, descrita no artigo 66 do Código Penal, quando comprovado o perfil social do acusado, desempregado, miserável, sem oportunidade de vida, devendo o Estado, na esteira da co-culpabilidade citada por Zaffaroni, espelhar a sua responsabilidade pela desigualdade social, fonte inegável dos delitos patrimoniais, no juízo de censura penal imposto ao réu. Tal circunstância pode e deve, também, atuar como instrumento da proporcionalidade na punição, imposição do Estado Democrático de Direito. (TJMG, 1ª Turma Criminal, Rel. ALEXANDRE VICTOR DE CARVALHO, julgamento em 27/03/2007); Como dito, a aplicação do princípio da coculpabilidade busca responsabilizar a mea culpa do Estado e da sociedade, pelas consequências de não oferecer oportunidades sociais iguais e econômicas para todos os cidadãos, impulsionando-os indiretamente ao cometimento de crimes. No entanto, como aludido por Grégore Moreira de Moura, (2016, p. 61) ‘’tendo, porém, como limite o cuidado para não transformar o criminoso em vítima e o Estado em criminoso, invertendo erroneamente as posições jurídicas de ambos.’’; Portanto, apesar de o princípio buscar a diminuição da pena, ou até mesmo a absolvição do indivíduo, dependendo da situação de exclusão social que o caso apresente, nem sempre essa miserabilidade poderá servir como escusa para prática de condutas ilícitas, dado que, ainda que seja um princípio geral, deve ser analisado caso a caso. A relação causal supostamente havida entre a situação de miserabilidade e a prática do crime deverá ser cabalmente comprovada para que o princípio possa ser aplicado; Ademais, acerca do princípio da coculpabilidade, afirma Grégore Moreira de Moura (2016, p.148): A diminuição do poder de autodeterminar-se deve ser reconhecida por meio da co-responsabilidade do Estado e da sociedade. Acentua-se, no entanto, que o princípio da co-culpabilidade não elimina a seletividade do sistema penal, mas atua como princípio corretor dessa seletividade, diminuindo sobremaneira seus impactos, dando ensejo ao desenvolvimento de um espírito crítico e responsável que oriente toda a sociedade. Além disso, aproxima o Direito Penal da culpabilidade material e, por conseguinte, da igualdade material; Por todos esses aspectos, entende-se que o princípio da coculpabilidade seria um critério corretor da seletividade do Direito Penal, objetivando uma mudança no âmbito legislativo, visto que, quem legisla no Brasil é a própria classe dominante, que acaba sendo favorecida pelas leis. Portanto, é necessária a positivação desse princípio para que sua aplicação na prática ocorra de forma obrigatória; A primeira hipótese é como circunstância judicial, prevista no Art. 59 do Código Penal, incidindo na primeira fase da aplicação da pena, conforme preconizado por Grégore Moreira de Moura (2016, p.128) "a mais tímida entre as demais, visto que será inócuo o reconhecimento da coculpabilidade se a pena base for fixada no mínimo legal, pois é cediço que as circunstancias judiciais não podem trazer a pena aquém do mínimo legal"; Na segunda opção, sua positivação seria prevista no Art. 65 do Código Penal, tratando-se de uma atenuante genérica, sendo mais uma alínea do lll do referido artigo, essa possibilidade, segundo Grégore Moreira de Moura (2016, p.128) "reforçaria a necessidade de sua aplicação, bem como limitaria o poder de liberdade e interpretação do magistrado"; A terceira possibilidade estaria positivada no Art. 29 do Código Penal, sendo acrescentado mais um parágrafo, dizendo que, como elucidado Grégore Moreira de Moura (2016, p. 128): Se o agente estiver submetido a precárias condições culturais, econômicas, sociais, num estado de hipossuficiência e miserabilidade sua pena será diminuída de um terço (1/3) a dois terços (2/3), desde que estas condições tenham influenciado e sejam compatíveis com o crime cometido. Assim, quanto pior as condições elencadas no supracitado parágrafo maior seria a redução da pena. É, a nosso sentir, a melhor hipótese para a positivação da co-culpabilidade, pois é a mais consentânea com o Direito Penal democrático e liberal, na esteira do garantismo penal, uma vez que permite maior individualização da pena aplicada, além de poder reduzir a pena aquém do mínimo legal, dirimindo qualquer dúvida nesse aspecto, com incidência na terceira fase da sua aplicação; A quarta e última opção seria uma causa de exclusão de culpabilidade, visto que o estado social de miserabilidade e vulnerabilidade do cidadão é tão caótico, proeminente e elevado, que sobre o agente não incidiria qualquer reprovação social e penal. (MOURA, 2016, p.129); Portanto, segundo essa opção, o comportamento do indivíduo nada mais é do que as consequências da omissão do Estado, frente as desigualdades sociais e as condições de marginalização do meio social em que foi inserido; Logo, o reconhecimento do princípio da coculpabilidade funcionaria, notadamente, como instrumento que visa à diminuição da exclusão social ao amparar aqueles indivíduos que vivem na miserabilidade, devido à inadimplência do Estado, dentro do ideal de se buscar um Direito Penal que mais se aproxime da realidade existente; Em virtude dos fatos analisados, conclui-se que é inegável o reconhecimento da coculpabilidade como princípio implícito. Sendo assim, é necessária sua positivação e aplicação, uma vez que os princípios, tanto explícitos quanto implícitos, são valores fundamentais que devem ser observados e aplicados de imediato, como fundamento de alguma norma; Portanto, a ausência expressa na lei não afasta seu caráter de princípio, que tem como função auxiliar os operadores de direito, buscando a democracia e efetivação dos próprios direitos fundamentais; Sendo assim, a aplicação da coculpabilidade reforça a ideia do princípio da dignidade da pessoa humana, uma vez que concretiza um passo inicial na correção da seletividade do Direito Penal, bem como na responsabilização e no reconhecimento da falha estatal frente aos cidadãos marginalizados, dado o estado de miserabilidade em que vivem, tornando-se assim, um direito fundamental do cidadão, com fundamento no Art. 5, § 2º da Constituição Federal; Como nem todos possuem as mesmas oportunidades, e alguns vivem em estado de miserabilidade - consequentemente, possuindo menos escolhas e tendo o âmbito de autodeterminação diminuído - é imprescindível que a coculpabilidade seja observada no momento da aplicação da pena, tornando-se, portanto, uma forma de equilíbrio das relações sociais; Isto posto, sua inserção no Código Penal pátrio possui algumas possibilidades, como circunstância judicial prevista no Art. 59, como atenuante genérica do Art. 65, ou sendo previsto como um parágrafo no Art. 29, como causa genérica de diminuição de pena, sendo esta a única hipótese capaz de reduzir a pena aquém do mínimo legal) https://jus.com.br/artigos/83377/analise-acerca-da-in-aplicabilidade-do-principio-da-co-culpabilidade-face-a-aplicacao-da-pena