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A possibilidade da aplicação das escusas absolutórias aos casos de violência patrimonial previstos na Lei Maria da Penha - 22/11/2017
A possibilidade da aplicação das escusas absolutórias aos casos de violência patrimonial previstos na Lei Maria da Penha (As escusas absolutórias ou imunidades absolutas estão previstas no Art. 181 do Código Penal Brasileiro, enquanto as chamadas escusas relativas são tratadas no Art. 182; O título ao qual o artigo se refere é o que trata dos crimes contra o patrimônio. Assim sendo, aquele que pratica crime contra o patrimônio contra uma das vítimas prevista no Art. 181, desde que não seja roubo, extorsão ou que não haja violência o grave ameaça contra pessoa, não será punível. Assim sendo, por exemplo, quando uma pessoa furta bem da própria esposa, não surge o direito de punir para o Estado, ficando o agente da conduta criminosa isento de qualquer punição no âmbito do direito penal; O Código Penal também prevê escusas relativas, conforme o Art. 182, supracitado. Naquelas hipóteses, para que haja processo criminal que possa culminar na responsabilização do agente criminoso, a lei estabelece que é necessária a representação por parte da vítima. Em outras palavras, é preciso que a vítima se dirija ao juiz, ao órgão do Ministério Público ou à autoridade policial e manifeste de maneira inequívoca a vontade de que aquele que atentou contra seu patrimônio seja processado no âmbito penal; Importante ressaltar que o Art. 183 do Código Penal, além de afastar a possibilidade de aplicação das escusas nos casos em que o crime seja de roubo ou de extorsão, ou, em geral, quando haja emprego de grave ameaça ou violência à pessoa, também impede que seja beneficiado o terceiro que concorre para o delito e qualquer um que os pratique contra pessoa com idade igual ou superior a sessenta anos. A citada disposição acerca da pessoa idosa foi adicionada pelo Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741, de 2003); Com a vigência da Lei Maria da Penha, estabeleceu-se um aparente conflito de normas no que se refere às citadas escusas absolutórias previstas no Código Penal. Surgiu, então, uma divergência na ciência jurídica, que se delineou com a formação de duas principais correntes doutrinas, que buscam responder ao questionamento: a nova legislação acerca da proteção à mulher afastou a aplicabilidade das escusas absolutórias no que se refere às hipóteses de violência patrimonial?; A primeira corrente defende a sobreposição da proteção à mulher contra a violência doméstica sobre os interesses tutelados pelas escusas absolutórias. Assim sendo, o argumento de manutenção da paz e harmonia no âmbito familiar não justificaria o enfraquecimento da proteção contra a violência doméstica e familiar. A Lei Maria da Penha, ao definir a proteção para a vítima de violência patrimonial, estaria afastando a aplicação das escusas absolutórias naqueles casos; Assim, nas palavras da professora Maria Berenice Dias (2008, p. 52): A partir da nova definição de violência doméstica, assim reconhecida também a violência patrimonial, não se aplicam as imunidades absolutas e relativas dos arts. 181 e 182 do Código Penal quando a vítima é mulher e mantém com o autor da infração vínculo de natureza familiar. Não há mais como admitir o injustificável afastamento da pena ao infrator que pratica um crime contra sua cônjuge ou companheira, ou, ainda, alguma parente do sexo feminino. Aliás, o Estatuto do Idoso, além de dispensar a representação, expressamente prevê a não aplicação desta excludente da criminalidade quando a vítima tiver mais de 60 anos; Seguindo a mesma linha, Feix (2009, p. 209) acrescenta: Utilizar argumentos de proteção à família como fundamento da política criminal em caso de violência patrimonial contra a mulher é desconhecer os fundamentos históricos, filosóficos e políticos que justificam e enquadram a Lei Maria da Penha como uma ação afirmativa do Estado brasileiro, que tem como objetivo promover a diminuição da estrutural desigualdade entre os gêneros, na família e no “sagrado” lar, que tem na violência poderoso instrumento de perpetração e reprodução; Defendendo tal posicionamento, argumenta-se que a aplicação das imunidades previstas na lei penal faz desaparecer a força e o sentido da proteção estabelecida pela Lei Maria da Penha. A previsão de repressão à violência patrimonial ficaria, assim, inócua, visto que sua aplicabilidade estaria amplamente limitada. Em resumo, a intenção legislativa por coibir a violência doméstica e familiar mostrar-se-ia pouco útil, favorecendo no contexto do processo penal a pessoa do agressor ou da agressora; Em sentido contrário, a segunda corrente defende que a Lei Maria da Penha não afasta a aplicação das escusas absolutórias. Assim sendo, não obstante a previsão da proteção à mulher que sofre violência patrimonial, o Estado não exercerá seu direito de punir contra aquele que pratica crime contra o patrimônio em desfavor de umas das pessoas listadas no Art. 181 do Código Penal, ainda que seja a vítima do gênero feminino; Nesse sentido, Sanches (2015, p. 384) justifica seu posicionamento nos seguintes termos: A uma, deve ser alertado que o Estatuto do Idoso, para impedir as escusas quando a vítima é pessoa idosa, foi expresso (diferente da Lei Maria da Penha, que nada dispôs nesse sentido, nem implicitamente); a duas, não permitir a imunidade para o marido que furta a mulher, mas permiti-la quando a mulher furta o marido, é ferir, de morte, o princípio constitucional da isonomia (aliás, a Lei 1 1 .340/2006 deve garantir à mulher vítima de violência doméstica e familiar especial proteção, e não simplesmente à mulher, mesmo quando autora!); Nesse mesmo posicionamento, conforme Lima (2015, p. 914): diante do silêncio da Lei Maria da Penha, que não contêm qualquer dispositivo expresso vedando a aplicação dos arts. 181 e 182 do CP, o ideal é concluir que as imunidades absolutas e relativas continuam sendo aplicáveis às infrações penais praticadas no contexto de violência doméstica e familiar contra a mulher. Quando a lei quis afastar a possibilidade de aplicação de tais imunidades a determinada espécie de crime, o fez de maneira expressa, a exemplo do que se dá na hipótese de crime praticado contra o patrimônio de idoso; Argumenta-se, nessa linha de pensamento, que a intenção legislativa de proteção à harmonia no âmbito familiar se impõe, visto que não existe previsão legal explícita em sentido contrário. Assim, quando foi intenção do legislador fazer exceções em relação à aplicação das imunidades, como no caso da pessoa idosa, o fez explicitamente. Ao deixar de afastar a punibilidade nos casos em estudo, o juiz estaria trazendo prejuízo ao réu com uma interpretação equivocada da norma; O conflito permanece no âmbito jurídico sem ser, todavia, solucionado pelo legislador através de edição de norma explicita que esclareça a matéria. Nesse contexto, fica a cargo do Poder Judiciário, quando provocado, definir os parâmetros de aplicação da norma no caso concreto; O Superior Tribunal de Justiça já se manifestou sobre o tema em estudo através de decisão da Quinta Turma, no Recurso em Habeas Corpus n. 42.918/RS, relatado pelo Ministro Jorge Mussi. Na ocasião se discutia o caso de um homem acusado de estelionato em desfavor da esposa, que pleiteava a aplicação da escusa absolutória do Art. 181, I, do Código Penal. Destaca-se que os cônjuges eram separados de fato, o que conforme a literatura jurídica, não afasta a aplicação do benefício, por falta de expressa previsão legal; Segue ementa da decisão: RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. TENTATIVA DE ESTELIONATO (ARTIGO 171, COMBINADO COM O ARTIGO 14, INCISO II, AMBOS DO CÓDIGO PENAL). CRIME PRATICADO POR UM DOS CÔNJUGES CONTRA O OUTRO. SEPARAÇÃO DE CORPOS. EXTINÇÃO DO VÍNCULO MATRIMONIAL. INOCORRÊNCIA. INCIDÊNCIA DA ESCUSA ABSOLUTÓRIA PREVISTA NO ARTIGO 181, INCISO I, DO CÓDIGO PENAL. IMUNIDADE NÃO REVOGADA PELA LEI MARIA DA PENHA. DERROGAÇÃO QUE IMPLICARIA VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA IGUALDADE. PREVISÃO EXPRESSA DE MEDIDAS CAUTELARES PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO DA MULHER EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR. INVIABILIDADE DE SE ADOTAR ANALOGIA EM PREJUÍZO DO RÉU. PROVIMENTO DO RECLAMO. 1. O artigo 181, inciso I, do Código Penal estabelece imunidade penal absoluta ao cônjuge que pratica crime patrimonial na constância do casamento. 2. De acordo com o artigo 1.571 do Código Civil, a sociedade conjugal termina pela morte de um dos cônjuges, pela nulidade ou anulação do casamento, pela separação judicial e pelo divórcio, motivo pelo qual a separação de corpos, assim como a separação de fato, que não têm condão de extinguir o vínculo matrimonial, não são capazes de afastar a imunidade prevista no inciso I do artigo 181 do Estatuto Repressivo. 3. O advento da Lei 11.340/2006 não é capaz de alterar tal entendimento, pois embora tenha previsto a violência patrimonial como uma das que pode ser cometida no âmbito doméstico e familiar contra a mulher, não revogou quer expressa, quer tacitamente, o artigo 181 do Código Penal. 4. A se admitir que a Lei Maria da Penha derrogou a referida imunidade, se estaria diante de flagrante hipótese de violação ao princípio da isonomia, já que os crimes patrimoniais praticados pelo marido contra a mulher no âmbito doméstico e familiar poderiam ser processados e julgados, ao passo que a mulher que venha cometer o mesmo tipo de delito contra o marido estaria isenta de pena. 5. Não há falar em ineficácia ou inutilidade da Lei 11.340/2006 ante a persistência da imunidade prevista no artigo 181, inciso I, do Código Penal quando se tratar de violência praticada contra a mulher no âmbito doméstico e familiar, uma vez que na própria legislação vigente existe a previsão de medidas cautelares específicas para a proteção do patrimônio da ofendida. (...) 7. Recurso provido para determinar o trancamento da ação penal apenas com relação ao recorrente (RHC 42.918/RS, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 05/08/2014, DJe 14/08/2014. Grifos nossos.); Nota-se que o ministro relator do processo defendeu o entendimento de que a Lei Maria da Penha não revogou, ainda que tacitamente, o Art. 181 do Código Penal. Para o magistrado, no que foi seguido pelos demais membro da turma, haveria desarrazoado desequilíbrio se se reconhecesse a inaplicabilidade da escusa absolutória no caso. Tal desequilíbrio consistiria na possibilidade de responsabilização de um homem que atentasse contra o patrimônio da esposa e no afastamento da punibilidade de uma mulher que praticasse crime contra o patrimônio do marido; Os ministros do Tribunal ainda defendem que seu entendimento acerca da manutenção das escusas absolutórias no contexto da violência doméstica não tornaria inútil a Lei Maria da Penha no que se refere à proteção à mulher contra a violência patrimonial. Para os membros daquela corte, as previsões do Art. 24 da lei acerca das medidas cautelares a serem adotadas para a proteção do patrimônio da ofendida possibilitam a efetividade da norma) https://jus.com.br/artigos/61326/a-possibilidade-da-aplicacao-das-escusas-absolutorias-aos-casos-de-violencia-patrimonial-previstos-na-lei-maria-da-penha