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A medida cautelar de retenção de passaporte - 28/01/2018

A medida cautelar de retenção de passaporte (Entre as medidas cautelares pessoais não prisionais, os juízes criminais podem determinar a retenção do passaporte do acusado — ou de outro documento de viagem —, como forma de assegurar a proibição de saída do País; Tal medida, prevista expressamente no Art. 320 do CPP desde 2011, serve para restringir os movimentos migratórios de pessoas sujeitas à jurisdição criminal brasileira, sejam elas nacionais ou estrangeiras, quando há fundadas razões para crer em sua fuga: Art. 320.  A proibição de ausentar-se do País será comunicada pelo juiz às autoridades encarregadas de fiscalizar as saídas do território nacional, intimando-se o indiciado ou acusado para entregar o passaporte, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas; Referido dispositivo dialoga com o inciso IV do Art. 319 do CPP, que regula a medida cautelar não prisional de proibição de saída do investigado ou réu da comarca em que vive quando sua permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou a instrução; Diante da previsão legal, é legítima a retenção de passaportes ou de documento de viagem (como o laissez-passer) para impedir Fulano, Beltrano ou Sicrano — isto mesmo, não confunda com “ciclano” — de deixar o País, desde que haja razões concretas, devidamente demonstradas, para temer uma fuga; Segundo o Art. 5º, inciso XV, da Constituição, é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, “podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens“. Restrições migratórias, portanto, sempre dependem de lei e do devido processo legal; Quão eficiente é a medida cautelar do Art. 320 do CPP?; Devido ao Acordo sobre Documentos de Viagem dos Estados Partes do MERCOSUL e Estados Associados (MERCOSUL/CMC/DEC Nº 18/08), ou Acordo de San Miguel de Tucumán, e a outros tratados regionais, qualquer cidadão brasileiro pode sair do País e entrar noutros Estados do bloco com a sua cédula de identidade (RG verde), sem passaporte. Neste contexto regional, é escassa a utilidade da medida cautelar prevista no Art. 320 do CPP; Ademais, pode-se ir do Brasil ao exterior por via fluvial ou terrestre sem documento algum, como bem sabem os brasileiros que vivem nas nossas fronteiras conturbadas, como são Ponta Porã e Pedro Juan Caballero (Paraguai), Santana do Livramento e Rivera (Uruguai) e inúmeras outras passagens fronteiriças do subcontinente; Num país com mais de 15 mil quilômetros de fronteiras porosas, que divide com uma dezena de nações sul-americanas, não é difícil deixar o nosso território sem ser importunado. Paulo César Farias, Henrique Pizzolato, Roger Abdelmassih e Guilherme Longo não me deixam mentir. Fugiram por elas. Assim, considerando essas vastas e inóspitas áreas não fiscalizadas, apreender passaporte de um suspeito, de um réu ou de um sentenciado é quase igual a nada; Se uma pessoa que é ou diz ser perseguida politicamente quiser furtar-se à jurisdição criminal do Brasil, não precisa sequer abandonar nosso território. Basta vir a Brasília e entrar na embaixada de um país sensível à sua causa e pedir asilo diplomático. Diferentemente do asilo territorial, no asilo diplomático o perseguido não precisa deixar seu país para entrar noutro e ali pleitear essa medida de proteção; Dou dois exemplos muito conhecidos e recentes: Exemplo 1: Julian Assange, dirigente do site Wikileaks, está desde junho de 2012 em asilo diplomático na embaixada equatoriana em Londres. Abrigou-se ali para evitar ser entregue à Justiça sueca, pois tem receio de ser reextraditado da Suécia para os Estados Unidos, onde enfrentaria gravíssimas acusações de espionagem e vazamento de dados relativos à segurança nacional norte-americana. Exemplo 2: em 2012, alegando perseguição por parte do presidente Evo Morales, o senador boliviano Roger Pinto Molina pediu asilo na nossa embaixada em La Paz, onde ficou por mais de um ano até fugir para cá em 2013, via Corumbá, com a ajuda do diplomata brasileiro Eduardo Saboia. Para fazer isto, a dupla decerto baseou-se no Art. 4º, inciso X, a Constituição, que estabelece que um dos princípios pelos quais a República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais é a concessão de asilo político; Essas duas situações revelam que, mesmo nas situações de suposta perseguição por motivos políticos ou de perseguição real, a retenção de passaportes pode ser absolutamente inócua, se o acusado realmente quiser fugir; Vale lembrar que o Brasil é signatário da Convenção sobre Asilo Diplomático, concluída em Caracas em 28 de março de 1954 (Decreto 42.628/1957), tratado interamericano que estabelece não ser licito “conceder asilo a pessoas que, na ocasião em que o solicitem, tenham sido acusadas de delitos comuns, processadas ou condenadas por êsse motivo pelos tribunais ordinários competentes, sem haverem cumprido as penas respectivas; nem a desertores das fôrças de terra, mar e ar, salvo quando os fatos que motivarem o pedido de asilo seja qual fôr o caso, apresentem claramente caráter político; Mesmo com todas essas vicissitudes, a medida cautelar de proibição de deixar o território nacional combinada com a retenção de passaporte só pode ser decretada pelo juiz competente, sempre a pedido do Ministério Público — ou da Polícia, para quem o admite. Cumpre ao juiz, em homenagem ao modelo acusatório e à sua deontologia, não adotar medidas ex officio em detrimento do acusado; É certo também que medidas desta ordem só podem ser requeridas e aplicadas quando haja fundada razão para crer que o réu pode fugir. Deve haver um risco concreto ou ao menos plausível de fuga (flight risk), não sendo suficientes meras conjecturas, notadamente quando se tratar de cidadão com vínculos sólidos com o País; O juiz que decreta esta ou qualquer outra cautelar pessoal ou real numa ação penal deve ter em conta a tutela de interesse ou utilidades deste mesmo processo penal, e não de outro em andamento numa jurisdição distinta, numa espécie de cautelaridade cruzada, o que é inadmissível; Os parâmetros para a imposição desta e de outras medidas cautelares devem observar o binômio necessidade + adequação, respeitadas, como pré-requisito, as regras constitucionais e legais de atribuição e competência. Diz o Art. 282 do CPP: Art. 282.  As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a: I – necessidade para aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais; II – adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado; O fato de o país xis ou ípsilon não ter tratado bilateral de extradição com o Brasil pode ser um argumento irrelevante para motivar cautelares pessoais  no processo penal. Muitos países cooperam sem tratado, com base em promessa de reciprocidade, inclusive o nosso (Art. 84, §2º, da Lei 13.445/2017). Cumpre, neste particular, evitar que as premissas adotadas para a restrição cautelar contra o investigado ou réu sejam motivadas por falácia do tipo non sequitur; Várias nações podem cooperar por mera reciprocidade, inclusive em matéria extradicional. Todos devem lembrar do caso Hosmany Ramos, famoso cirurgião que foi condenado por uma série de crimes e que fugiu de São Paulo para a Islândia e de lá foi extraditado ao Brasil em 2010 mesmo não havendo tratado extradicional entre esses dois países; O Brasil mantém tratados bilaterais de extradição com menos de 30 Estados soberanos (veja aqui), além de ter ratificado duas convenções multilaterais específicas do Mercosul e uma da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). A utilização da reciprocidade supre esse grande hiato geográfico, o que nos permite cooperar com inúmeros países do globo, salvo com aqueles que seguem o modelo “no extradition without treaty”; Um bom exemplo é a Alemanha, país com o qual não temos tratado bilateral de extradição, mas com o qual as promessas de reciprocidade são usuais na relação bilateral, como se vê abaixo: EXTRADIÇÃO FUNDADA EM PROMESSA DE RECIPROCIDADE. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. SONEGAÇÃO FISCAL. ATENDIMENTO DOS REQUISITOS FORMAIS. DUPLA TIPICIDADE E PUNIBILIDADADE. INEXISTÊNCIA DE PRESCRIÇÃO EM AMBOS OS ORDENAMENTOS JURÍDICOS. DEFERIMENTO. 1. A falta de tratado de extradição entre o Brasil e a República Federal da Alemanha não impede o atendimento da demanda, desde que o requisito da reciprocidade seja atendido mediante pedido formalmente transmitido por via diplomática. Precedentes.  (…) 4. Extradição deferida. (STF, 2ª Turma, Ext 1363, Relator Min. Teori Zavascki, julgado em 10/03/2015); A promessa de reciprocidade também foi o que permitiu ao STF deferir pedido de extradição passiva formulado pela República da Sérvia (STF, 1ª Turma, Ext 1208 , Rel. Min. Dias Toffoli, j. em 19/11/2013). Também foi assim na Ext 357, requerida pela República do Líbano (STF, Pleno, EXT 357, Rel. Min. Leitão de Abreu, j. em 14/12/1978); No sentido inverso, do exterior ao Brasil (extradição ativa), um dos casos mais conhecidos de uso da reciprocidade é o do banqueiro Salvatore Cacciola, cuja extradição foi negada por um país com o qual tínhamos tratado (a Itália), mas concedida por outra nação com a qual tratado algum havia (Mônaco). O compromisso de reciprocidade foi suficiente para a entrega de Cacciola ao Brasil em 2008; Ainda que a reciprocidade não fosse suficiente para a cooperação extradicional brasileira, não custa lembrar que 183 países são partes da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção (UNCAC na sigla em inglês), concluída em Mérida em 2003 (Decreto 5.687/2006), cujo Art. 44 dispõe sobre extradição entre os Estados signatários e admite no §5º o uso desse tratado como base supletiva para a extradição por crimes convencionais (isto é, os nela previstos): Eis a péssima tradução brasileira: “5. Se um Estado Parte que submete a extradição à existência de um tratado recebe uma solicitação de extradição de outro Estado Parte com o qual não celebra nenhum tratado de extradição, poderá considerar a presente Convenção como a base jurídica da extradição a respeito dos delitos aos quais se aplicam o presente Artigo”. Tradução da República Portuguesa, de qualidade superior: “5. Se um Estado Parte, que condicione a extradição à existência de um tratado, receber um pedido de extradição de um Estado Parte com o qual não celebrou nenhum tratado de extradição, poderá considerar a presente Convenção como fundamento jurídico da extradição quanto às infracções a que se aplique o presente artigo”; Vale dizer. Nos casos de corrupção, lavagem de dinheiro e nos demais delitos convencionais, a falta de tratado entre os países que precisam cooperar em matéria criminal pode ser suprida pela Convenção de Mérida, cujo artigo 44 é esteio supletivo para a cooperação extradicional com os chamados treaty-needed countries (TNC), ou seja, os países que só cooperam caso exista tratado. Normalmente, os TNC são países de tradição common law, que se valem da regra “no extradition without treaty”, isto é, sem tratado não há extradição; Portanto, a falta de tratado bilateral de extradição não é obstáculo à captura e obtenção da custódia de foragidos quando há promessa de reciprocidade (para os países que a admitem) ou quando existe base comum multilateral (para os Estados Partes); Todos os 183 Estados Partes da United Nations Convention against Corruption (UNCAC), se este for o gênero de crimes cometidos pelo réu em questão, podem valer-se dela para extradições caso falte um tratado extradicional específico, como está claro em seu artigo 44, §5º; Atualmente, somente Barbados, Chade, Coreia do Norte, Djibuti, Eritreia, Guiné Equatorial, Síria, Suriname não são partes dessa Convenção que é, não custa repetir, supletiva para extradição e também para mutual legal assistance (MLA), de modo que pode e deve ser usada subsidiariamente; Outros tratados internacionais cumprem o mesmo papel  no que diz respeito aos crimes neles previstos (“crimes convencionais”), como são exemplos a Convenção das Nações Unidas contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e Substâncias Psicotrópicas (Convenção de Viena), concluída em 1988 e promulgada pelo Decreto 154/1991, e a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional (Convenção de Palermo), concluída em 2000 e promulgada no Brasil pelo Decreto 5.015/2004; Em suma, quando se faz necessário capturar foragidos noutra jurisdição, há a possibilidade de extradição com ou sem tratado; Não havendo tratado bilateral nem convenção multilateral específicos sobre matéria extradicional, os Estados em questão podem valer-se de promessa de reciprocidade; Não sendo a promessa de reciprociade admitida pelo direito local, os Estados podem servir-se de convenções internacionais subsidiárias, usando, entre aquelas das quais sejam parte, a que se refira ao crime objeto do pedido de extradição) https://vladimiraras.blog/2018/01/27/passaportes-e-pasos-de-los-libres/
Autor: Mattosinho Advocacia Criminal

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