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Standard de prova além da dúvida razoável (proof beyond a reasonable doubt) - 14/08/2018
Standard de prova além da dúvida razoável (proof beyond a reasonable doubt) (Susan Haack[1], professora na Universidade de Miami (EUA), afirma que um julgamento não é como uma investigação científica, na qual se pode tomar o tempo necessário para esmiuçar todas as provas possíveis. Afinal, as determinações jurídicas dos fatos estão sujeitas a limitações de tempo e de restrições a respeito da forma de obtenção e do tipo de provas que podem ser legalmente apresentadas. Conclui asseverando que o que se exige do julgador dos fatos não é que determine se o acusado é culpado, mas, sim, que defina se a culpabilidade do acusado foi estabelecida pelas provas produzidas no grau exigido. E esse grau, essa quantidade de prova (quantum of proof) exigida no processo penal, para fins de condenação, é o da prova mais além da dúvida razoável; Oriundo do Direito anglo-saxão, o standard de prova beyond a reasonable doubt (além da dúvida razoável) constitui o critério atualmente mais aceito, no âmbito do processo penal, para se proferir um julgamento justo (fair trial)[2]. Além do mais, tal standard conduz à interpretação mais correta e lúcida do princípio in dubio pro reo; Conforme o standard de prova beyond a reasonable doubt, havendo prova além da dúvida razoável da culpabilidade do réu, é o que basta para a prolação de uma sentença condenatória, sendo certo, também, que tal dúvida razoável deve ser valorada de acordo com as dificuldades probatórias do caso concreto e, também, em função do delito praticado[3]; Como bem disse Alan Dershowitz[4], famoso advogado e professor emérito na Harvard Law School, “os científicos buscam a verdade. Os filósofos buscam a moral. Um processo penal busca somente a prova mais além de toda a dúvida razoável”; E o que seria dúvida razoável?; Para esclarecer esse conceito, Larry Laudan[5] menciona um famoso caso julgado em 1850 (Commonwealth v. Webster, 59 Mass. 295:320 (1850)), na qual o juiz Lemuel Shaw, presidente da Corte Suprema de Massachussets (EUA), proferiu uma decisão que se converteu na formulação clássica do standard além da dúvida razoável. Segundo o referido magistrado, a dúvida razoável é um termo usado com frequência, provavelmente bem compreendido, todavia, difícil de definir. Não se trata simplesmente de uma dúvida possível, já que tudo que está relacionado com a atividade humana, o qual depende de provas que apenas produzem certeza moral, está aberto a alguma dúvida possível ou imaginária. A dúvida razoável trata, portanto, desse estado do caso que deixa a mente do julgador em uma condição tal que não possa dizer que experimenta uma convicção perdurável, que produz certeza moral, sobre a verdade buscada. Se subsiste uma dúvida razoável em relação à prova da culpabilidade, o acusado tem direito de se beneficiar da presunção de inocência e ser absolvido. Assim, as provas hão de estabelecer a verdade dos fatos no sentido de produzir uma certeza razoável ou moral, vale dizer, uma certeza que convence, dirige o entendimento e que satisfaz a razão e o juízo dos julgadores. Isso, conclui, é o que se considera prova mais além de toda a dúvida razoável; Sobre o tema, Jordi Nieva Fenoll[6], professor catedrático da Universidade de Barcelona, preleciona que no processo penal a exigência do standard de prova é muito mais alto que no processo civil, pois se exige que a culpabilidade do réu esteja demonstrada “mais além de toda a dúvida razoável”. Essa expressão diz ao julgador que a probabilidade de o acusado ser responsável pelos fatos deve ser valorada como muito alta para que seja declarado culpado. Assim, reconhece não ser possível se chegar praticamente nunca à completa certeza (certeza absoluta). E acrescenta, ainda, que exigir essa certeza plena provocaria um aumento irracional do número de absolvições; A propósito, Lord Nicholls[7], juiz da Court of Final Appeal, na Inglaterra, assevera que a lei busca a probabilidade, não a certeza, pois esta é raramente acessível. Dessa forma, aduz que, “se a evidência é tão forte contra uma pessoa, a ponto de deixar apenas uma remota possibilidade em seu favor, que pode ser afastada com o raciocínio “é claro que é possível, mas não é minimamente provável”, então o caso estará provado acima da dúvida razoável”; Cumpre registrar, também, o magistério doutrinário de Perfecto Andrés Ibáñez[8], magistrado do Tribunal Supremo da Espanha, ao afirmar que “decidir jurisdicionalmente conforme a presunção de inocência, em rigor, equivale a entender que somente se condenará quando não existir nenhuma dúvida razoável acerca da realização do delito e da identidade do autor”; No Brasil, o Supremo Tribunal Federal já faz menção a tal standard desde o ano de 1996 (vide, por exemplo, HC 73.338/RJ, relator min. Celso de Mello, DJ de 19/12/1996). Esta corte, também, citou-o no emblemático “caso do mensalão” (APN 470/MG, rel. min. Joaquim Barbosa, Tribunal Pleno, Dje de 22/4/2013), ocasião em que o ministro Luiz Fux consignou, com bastante propriedade, que “o critério de que a condenação tenha que provir de uma convicção formada para 'além da dúvida do razoável' não impõe que qualquer mínima ou remota possibilidade aventada pelo acusado já impeça que se chegue a um juízo condenatório. Toda vez que as dúvidas que surjam das alegações de defesa e das provas favoráveis à versão dos acusados não forem razoáveis, não forem críveis diante das demais provas, pode haver condenação”. E mais recentemente, o referido standard foi mencionado nos julgamentos de duas ações penais de competência originária (AP 521/MT, Dje de 6/2/2015 e AP 580/SP, Dje de 26/6/2017), tendo nesta última a ministra relatora Rosa Weber afirmado expressamente que “a presunção de inocência, princípio cardeal no processo criminal, é tanto uma regra de prova como um escudo contra a punição prematura. Como regra de prova, a formulação mais precisa é o standard anglo-saxônico no sentido de que a responsabilidade criminal deve ser provada acima de qualquer dúvida razoável (proof beyond a reasonable doubt)”; Outra grande vantagem em se adotar tal standard de prova, é que ele conduz à verdadeira e adequada interpretação do princípio in dubio pro reo; Por fim, impende frisar que o standard de prova beyond a reasonable doubt é perfeitamente compatível com o Direito Processual Penal brasileiro. Veja-se, a propósito, o artigo 386, VI, do CPP, que dispõe que o réu será absolvido quando houver fundadas dúvidas sobre a existência de circunstâncias que excluam o crime ou que o isentem de pena. Fundadas dúvidas devem ser lidas como dúvidas razoáveis, isto é, não como simples e mera dúvida. O artigo 386, VII, do CPP, por sua vez, consigna que o réu deve ser absolvido quando não existir prova suficiente para a condenação, ou seja, quando não for produzida prova além da dúvida razoável deve o acusado ser absolvido, ficando evidente, portanto, que não é qualquer dúvida que enseja a absolvição, mas sim aquela fundada e razoável dúvida (reasonable doubt)) https://www.conjur.com.br/2018-ago-14/andre-melgaco-reis-standard-prova-alem-duvida-razoavel?utm_source=dlvr.it&utm_medium=facebook