Quarta-feira
04 de Junho de 2025 - 
Você tem garantias e direitos, portanto, conte com o seu Advogado de confiança para defendê-lo (a)

Acompanhamento Processual

Acesso ao controle de processos

Notícias

Artigos

O uso de algemas pela Polícia - aspectos legais, técnicos e operacionais frente ao Decreto Federal n. 8.856-16 - 21/12/2018

O uso de algemas pela Polícia - aspectos legais, técnicos e operacionais frente ao Decreto Federal n. 8.856-16 (No Brasil, o uso de algemas está regulado em âmbito federal, cabendo às normas locais o papel de complementação; O Supremo Tribunal Federal, em 2008, editou a Súmula Vinculante n° 11, a qual impôs regras mais claras para o uso de algemas; Com o escopo de aplacar dúvidas porventura ainda existentes, o legislador nacional, em setembro de 2016, decidiu em boa hora disciplinar o Art. 199 da Lei de Execução Penal (que fazia alusão genérica ao disciplinamento desse equipamento de contenção), a fim de, finalmente, regrar, de maneira expressa, o emprego de algemas no Brasil; O Código de Processo Penal, em seu Art. 284, diz que não será permitido o emprego de força, salvo a indispensável no caso de resistência ou de tentativa de fuga do preso. Adiante, no Art. 292, estabelece que se houver, ainda que por parte de terceiros, resistência à prisão em flagrante ou à determinada por autoridade competente, o executor e as pessoas que o auxiliarem poderão usar dos meios necessários para defender-se ou para vencer a resistência; Esses princípios, durante muito tempo, serviram de espeque para o emprego de algemas nos casos de resistência ou tentativa de evasão do preso. E mais, esses chamados “meios necessários”, previstos no Art. 292, englobavam quaisquer métodos de submissão física, dentre eles, as algemas; Em razão disso, conquanto atualmente tenhamos uma legislação específica, esses dois dispositivos do Código de Processo Penal não perderam a eficácia e, combinados com o Decreto Federal n° 8.856/16, continuam a abranger as hipóteses de emprego de força, lembrando que as algemas, ao contrário da ação exclusivamente ativa, visam, de maneira indireta, controlar e anular a recalcitrância. Ou seja, é o uso da força para a neutralização da força do preso; O Código de Processo Penal Militar, ao contrário do comum, prevê expressamente o emprego de algemas e, em seu Art. 234, diz que o ato deve ser evitado, desde que não haja perigo de fuga ou de agressão por parte do preso. Note-se que o fundamento é similar ao dos que norteiam o uso da força, daí não requer tal norma, pela obviedade, maiores anotações; Em tempo, fala o dispositivo, ainda, sobre os dignitários (ministros, governadores, magistrados etc) sob os quais o emprego de algemas seria defeso. Entretanto, cremos que tal regramento não foi recepcionado pela nova ordem constitucional e, por força da regra da igualdade – e em havendo expressa necessidade fática –, as algemas podem ser usadas em quaisquer pessoas; O Art. 474 do Código de Processo Penal passou a prever, em seu parágrafo 3º, que não se permitirá o uso de algemas no acusado durante o período em que permanecer no plenário do júri, salvo se absolutamente necessário à ordem dos trabalhos, à segurança das testemunhas ou à garantia da integridade física dos presentes; De acordo com o Art. 10 da Lei Federal nº 9.537/97, o comandante, no exercício de suas funções e para garantia da segurança das pessoas, da embarcação e da carga transportada, pode ordenar a detenção de pessoas em camarotes ou alojamento, se necessário com algemas, quando imprescindível para a manutenção da integridade física de terceiros, embarcação ou carga; Conquanto não faça expressa alusão a “algema”, o Art. 168 da Lei Federal nº 7.565/86 (Código Brasileiro de Aeronáutica), estabelece que durante o período de tempo previsto no artigo 167 (apresentação para o voo e entrega do avião após a viagem), o Comandante exerce autoridade sobre as pessoas e coisas que se encontrem a bordo da aeronave e poderá: I - desembarcar qualquer delas, desde que comprometa a boa ordem, a disciplina, ponha em risco a segurança da aeronave ou das pessoas e bens a bordo e; II - tomar as medidas necessárias à proteção da aeronave e das pessoas ou bens transportados; Nestes termos, a máxima “tomar as medidas necessárias” engloba toda e qualquer ação que tenha por fim resguardar a segurança do voo, incluindo-se aí a própria privação temporária da liberdade de alguém que, injustamente, esteja colocando a incolumidade geral em risco. E em havendo recalcitrância, o emprego de algemas será medida necessária e lícita, cuja base legal encontra-se no próprio Código de Aeronáutica; Registre-se que, em sede de “habeas corpus” (1999.01.00.106790-1/RO), a 5ª Turma do TRF da 1ª Região já decidiu que “Ao comandante, no âmbito da aeronave que conduz, cabe o exercício do poder de polícia”, o que reforça a tese supra; Não raro, a Polícia necessita transportar pessoas presas em aeronaves civis. Diante disso, a ANAC, através da Instrução de Aviação Civil n° 2504/09, itens 4 e 5, normatizou que quando conduzindo prisioneiros, o embarque, marcação de lugares e desembarque devem ser feitos de acordo com as instruções dos integrantes do DPF (Polícia Federal), os quais decidirão se desejam o embarque antecipado e desembarque prioritário, bem como, quais os assentos mais convenientes no avião. Caso o prisioneiro seja transportado com algemas esta situação deverá, se possível, ser encoberta. Tal se faz necessário, ao que nos parece, para a necessária preservação da imagem das pessoas presas, a fim de que não sejam elas submetidas a exposição pública na qualidade de custodiadas; Em 25 de janeiro de 2018 a ANAC publicou a Resolução n° 461/18, a qual dispõe, dentre outros procedimentos, sobre o transporte de passageiros sob custódia a bordo de aeronaves civis. Por força dela, o operador aéreo deverá negar o embarque de passageiro custodiado em aeronaves civis se a equipe de escolta não for composta por, no mínimo, dois profissionais por passageiro custodiado. A equipe de escolta de passageiro custodiado deverá dispor de equipamentos de contenção[1], sendo vedado o porte de gás lacrimogêneo ou similar incapacitante. A equipe de escolta deverá garantir que o passageiro sob custódia não seja algemado a partes fixas da aeronave, salvo em situações em que o passageiro apresentar comportamento que o caracterize como passageiro indisciplinado, e esteja sempre acompanhado e mantido sob vigilância, inclusive durante o uso dos sanitários; Pode ocorrer que os agentes da Polícia, ao levarem um preso para o exame de corpo de delito, sejam instados pelos peritos-legistas sobre a retirada das algemas para a verificação corporal; Diante disso, é importante que o condutor tenha em mãos elementos que possam dar subsídio a existência ou não desse risco, para repassá-los ao perito (que também é policial, agente da autoridade, tal qual o condutor) a fim de que as algemas não sejam indiscriminadamente retiradas e a integridade de todos, dos policiais e do periciando, seja preservada; Caso o preso seja de alta periculosidade ou tenha tido um comportamento motivador do emprego da constrição por algemas, os agentes devem deixar isso claro ao perito e, se ainda assim houver insistência por parte deste para a retirada do equipamento, a autoridade policial deverá ser contatada para intervir e sanar a questão, com a adoção de providências legais inclusive, afinal, nestes casos, o que deve prevalecer é o interesse público de preservação geral da ordem e não a vontade unilateral de um servidor que, legalmente, não detém ascendência hierárquica sobre os condutores; Em tempo, é importante destacar que o Manual Operacional do Policial Civil diz que: “o preso somente poderá ser desalgemado mediante ordem da autoridade competente, que deverá ser previamente informada a respeito da periculosidade do suspeito”[2]; O emprego de algemas em adolescentes sempre foi um assunto polêmico, pois, por vezes, surgem vozes que defendem a sua proibição. Em termos legais, por outro lado, inexistem óbices a isso, conforme adiante faremos ver; A Lei Federal n° 8.069/90 estatui em seu Art. 178 que “o adolescente a quem se atribua autoria de ato infracional não poderá ser conduzido ou transportado em compartimento fechado de veículo policial, em condições atentatórias à sua dignidade, ou que impliquem risco à sua integridade física ou mental, sob pena de responsabilidade”; Assim, fica patente que o adolescente não pode ser transportado apenas sob três circunstâncias, sendo certo que, em nenhuma delas, existe menção sobre a proibição do uso de algemas; Nesse passo, desde que cumpridas as regras previstas em lei (resistência, fundado receio de fuga ou perigo a integridade própria ou alheia), o emprego de algemas em adolescentes é lícito, já que a ação, quando executada com as técnicas operacionais adequadas, não pode ser confundida com um atentado conciso a dignidade do menor; Em acórdão de 06 de junho de 2005, o Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de Goiânia entendeu que, com relação ao autor de ato infracional, “a utilização de algemas é autorizada nas hipóteses em que se configure como meio necessário de contenção e segurança, pelo que inadmissível a invocação de arbitrariedade, se não demonstrada pela defesa situação indicativa da sua não ocorrência”; Em São Paulo, a Vara Especial da Infância e da Juventude, através da Portaria n° 004/2007, disciplinou que o emprego de algemas na condução, circulação ou permanência de adolescentes nas áreas comuns do fórum, para quaisquer fins ou destinação, dependerá de prévia determinação judicial comunicada com antecedência a serviço de vigilância e fiscalização judiciária. E no interior das salas de audiência e gabinetes de magistrados, promotores de justiça e defensores públicos, a eles competirá decidir a respeito. Ou seja, se tal ação fosse ilegítima como um todo, o Poder Judiciário jamais editaria um ato alusivo ao tema “algemas”, mas, de maneira cautelar, o fez para que inexistissem dúvidas quanto a necessidade da constrição em determinados casos, mormente os que envolvam adolescentes perigosos; No que tange as crianças, estas não são legalmente apreendidas, pois a lei reserva a elas as chamadas “medidas de proteção”; Diz a Súmula Vinculante n° 11 do STF que "Só é lícito o uso de algemas em caso de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado"; Cerca de trinta e dois anos após a Lei de Execução Penal prever que o uso de algemas seria disciplinado por decreto federal, o legislador, premido pelas circunstâncias sociais, finalmente achou por bem editar o Decreto Federal n° 8.856/16, o qual regulamentou o disposto no Art. 199 da Lei Federal n° 7.210/84; O Art. 1º, inciso I, menciona que o emprego de algemas terá como diretrizes o inciso III do “caput” do Art. 1º e o inciso III do “caput” do Art. 5º da Constituição, os quais dispõem sobre a proteção e a promoção da dignidade da pessoa humana e sobre a proibição de submissão ao tratamento desumano e degradante. De caráter autoexplicativo, esse dispositivo tenciona deixar claro que o uso da força jamais poderá esbarrar em ações que maculem a integridade física ou psíquica do cidadão; O inciso II alude a Resolução n° 2010/16 das Nações Unidas, a qual se refere ao tratamento de mulheres presas e medidas não privativas de liberdade para mulheres infratoras, a “regra de Bangkok”; E enfim, temos o inciso III da norma, que fala no Pacto de San José da Costa Rica, o qual determina o tratamento humanitário dos presos e, em especial, das mulheres em condição de vulnerabilidade, assunto que, como o visto, enfrentaremos adiante; O aspecto mais impactante da nova legislação está no seu Art. 2º, o qual estabelece que ser permitido o emprego de algemas apenas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, causado pelo preso ou por terceiros, justificada a sua excepcionalidade por escrito; Em sentido genérico, “resistência” é a oposição ao ato legal emanado pela autoridade ou agente com atribuição para aplicar a medida, podendo ser ela “ativa” ou “passiva”; A resistência “ativa” é aquela exercida com violência ou ameaça, e é considerada criminosa (Art. 329 do Código Penal). É a reação à ação policial desferindo socos, chutes, arremessando objetos etc. Diante disso, além do crime anterior e da possível lesão, o indivíduo ainda responde pela resistência, cuja pena básica é de dois meses a dois anos de detenção; A resistência “passiva” é aquela em que o sujeito resiste sem esboçar força ativa, recusando-se, de maneira inerte, a acatar uma deliberação legal. Como exemplo da resistência passiva temos o ato de jogar-se contra a parede, agarrar-se nas pessoas, prender-se a quaisquer objetos no intuito de impedir a sua condução etc. Como o decreto não disciplina taxativamente a espécie de resistência, ela pode ser interpretada das duas formas, i.e., ativa ou passiva. O sujeito, em tese, não comete crime de resistência – falta a violência ou ameaça a funcionário, afinal ele exerceu apenas força negativa –, mas pode incorrer, em sendo o caso, em desobediência; O “fundado receio de fuga” reside na desconfiança justificada e relevante de que o indivíduo tente se subtrair da custódia. Exemplos não faltam, como a prisão de infrator já conhecido das lidas policiais; prisão de pessoa que resistiu; prisão de pessoa suspeita da prática de infração violenta ou tráfico de drogas; prisão ou recaptura de pessoa com antecedentes de fuga ou tentativa de fuga; transferências de pessoas presas ou apreendidas; escoltas ao Fórum etc. No caso da recaptura a legitimidade ganha força especial, afinal o preso se encontra na condição de foragido e, se escapou uma vez, certamente poderá fazê-lo novamente, cabendo ao policial redobrar cautela; O “perigo à integridade física própria ou alheia, causado pelo preso ou por terceiro”, pode ser detectado na prisão de pessoa visivelmente violenta, com sintomas de embriaguez pelo álcool ou substância de efeitos similares; na prisão de pessoa com sintomas de doença mental ou qualquer distúrbio psíquico; no transporte de pessoas presas ou apreendidas em veículos desprovidos de isolamento apropriado (“chiqueirinho”); no translado aéreo em aviões não adaptados ao isolamento; na prisão de pessoa portando armas; na prisão de pessoa dotada de conhecimentos em artes marciais ou luta corporal; nas hipóteses de haver um número insuficiente de policiais para prisão de mais de uma pessoa etc; Vê-se, pois, que embora os critérios sejam de certa forma objetivos, requer-se certa discricionariedade do policial para constatar a necessidade ou não do uso do equipamento, o que só será possível diante da análise do conjunto comportamental do conduzido, cuja realização se baseará na experiência profissional e na capacidade de percepção adquirida pelo policial na constância da sua atividade, a qual possibilitará a identificação de condutas e situações concretas que, de pronto, justifiquem a algemação. Ou seja, é a junção da regra da discricionariedade com a regra da proporcionalidade; Do exposto, podemos concluir que compete apenas aos policiais responsáveis pela condução ou escolta decidir pelo uso de algemas, desde que o façam de maneira apropriada, motivada e escrita; Diz o Art. 3º do Decreto Federal n° 8.856/16, ser vedado emprego de algemas em mulheres presas em qualquer unidade do sistema penitenciário nacional durante o trabalho de parto, no trajeto da parturiente entre a unidade prisional e a unidade hospitalar e após o parto, durante o período em que se encontrar hospitalizada; Antes dele, a Lei Federal n° 13.434/17 (a qual incluiu o parágrafo único do Art. 292 do Código de Processo Penal), estabelecia ser vedado o uso de algemas em mulheres grávidas durante os atos médico-hospitalares preparatórios para a realização do parto e durante o trabalho de parto, bem como em mulheres durante o período de puerpério imediato; Tema quase nunca analisado pela doutrina, a chamada “lesão de resistência” tem relevante valor para o trabalho policial, pois, não raro, pessoas mal intencionadas buscam responsabilizar a Polícia, de maneira concisa, por toda e qualquer lesão experimentada pelo preso; As lesões de resistência são aquelas que revelam ofensa a integridade física de alguém que, em razão do próprio comportamento agressivo, deu exclusiva causa a elas. É o caso do preso algemado que força intencionalmente as barras da algema contra os próprios pulsos, de modo a lesioná-los a fim de tentar angariar elementos para macular o ato da prisão. O modo de evitar isso é o acionamento da trava secundária (antiestrangulamento), que obsta a tração da trava simples e frustra a intenção do detido. Outra hipótese é a do preso que agride a equipe policial ou se debate para não ser contido, experimentado ferimentos em razão disso. É óbvio que, para se defender, o policial terá que usar a força e, por conta disso, é mais óbvio ainda que o recalcitrante aufira lesões de resistência, as quais, em estando na média aceitável da força oposta, devem ser consideradas parte do contexto e absorvidas pelas excludentes legais; Essas lesões, que por vezes visam manchar a legalidade da prisão, exigem do policial a expertise necessária para evitar com que o preso use desse subterfúgio contra o Estado, angariando, para tanto, elementos testemunhais ou audiovisuais que deem conta da situação agressiva do preso ou das pouco ortodoxas das ações dele; Note-se que no Brasil o crime de abuso de autoridade não existe na forma culposa e, salvo uma ação deliberada do agente, não há que se falar em responsabilização civil, administrativa ou criminal no caso da lesão de resistência que guarde proporcionalidade com a oposição encontrada; A apresentação pública de pessoas presas, sem prejuízo das regras constitucionais a respeito da garantia individual da intimidade, são usualmente disciplinadas por Portarias do Poder Judiciário, mormente os juízos corregedores das polícias judiciárias; Destarte, é importante destacarmos que a lei não proíbe o uso de algemas nessas situações, desde que a medida seja necessária e adequada aos termos do Decreto Federal n° 8.856/16) https://jus.com.br/artigos/68953/o-uso-de-algemas-pela-policia-aspectos-legais-tecnicos-e-operacionais-frente-ao-decreto-federal-n-8-856-16
Autor: Mattosinho Advocacia Criminal

Contate-nos

Sede do escritório

Rodovia Transamazônica  20
-  Novo Horizonte
 -  Pacajá / PA
-  CEP: 68485-000
+55 (91) 991040449+55 (91) 37981042
© 2025 Todos os direitos reservados - Certificado e desenvolvido pelo PROMAD - Programa Nacional de Modernização da Advocacia
Pressione as teclas CTRL + D para adicionar aos favoritos.