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Legitimidade constitucional das revistas íntimas em presídios - 06/10/2017
Legitimidade constitucional das revistas íntimas em presídios (No Brasil se registram uma séria de atos normativos que regulamentam a matéria, mas em particular importa aqui anotar a Lei Federal 13.271/2016, já em vigência, que, na sua versão aprovada pelo Congresso Nacional, dispunha sobre a proibição de revista íntima de funcionárias nos locais de trabalho e trata da revista íntima em ambientes prisionais". A teor do artigo 1º do referido diploma legal “As empresas privadas, os órgãos e entidades da administração pública, direta e indireta, ficam proibidos de adotar qualquer prática de revista íntima de suas funcionárias e de clientes do sexo feminino”, dispondo, no artigo 2º, que a violação de tal vedação será sancionada da seguinte forma: I - multa de R$ 20 mil ao empregador, revertidos aos órgãos de proteção dos direitos da mulher; II - multa em dobro do valor estipulado no inciso I, em caso de reincidência, independentemente da indenização por danos morais e materiais e sanções de ordem penal. Em relação às revistas íntimas em ambientes prisionais a versão original da Lei previa, no seu artigo 3º, que “Nos casos previstos em lei, para revistas em ambientes prisionais e sob investigação policial, a revista será unicamente realizada por funcionários servidores femininos."; Tal dispositivo foi objeto de veto presidencial, pelo fato de “A redação do dispositivo possibilitaria interpretação no sentido de ser permitida a revista íntima nos estabelecimentos prisionais. Além disso, permitiria interpretação de que quaisquer revistas seriam realizadas unicamente por servidores femininos, tanto em pessoas do sexo masculino quanto do feminino." Por tal razão, inexiste previsão legal específica em nível nacional que permita ou mesmo proíba expressamente a revista íntima em estabelecimentos carcerários brasileiros, o que, por si só, evidentemente não afasta a possibilidade de se justificar a sua vedação no todo ou pelo menos submetida a determinados critérios com base no marco normativo constitucional e internacional, tampouco impede necessariamente a criação e aplicação de atos normativos infralegais ou mesmo de legislação estadual sobre o tema; Nesse contexto, calha invocar a Resolução 5/2014 do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, que (segue teor literal), “de acordo com regulamentação resolve recomendar que a revista de pessoas por ocasião do ingresso nos estabelecimentos penais seja efetuada com observância do seguinte: Art. 1º. A revista pessoal é a inspeção que se efetua, com fins de segurança, em todas as pessoas que pretendem ingressar em locais de privação de liberdade e que venham a ter contato direto ou indireto com pessoas privadas de liberdade ou com o interior do estabelecimento, devendo preservar a integridade física, psicológica e moral da pessoa revistada. Parágrafo único. A revista pessoal deverá ocorrer mediante uso de equipamentos eletrônicos detectores de metais, aparelhos de raio-x, scanner corporal, dentre outras tecnologias e equipamentos de segurança capazes de identificar armas, explosivos, drogas ou outros objetos ilícitos, ou, excepcionalmente, de forma manual. Art. 2º. São vedadas quaisquer formas de revista vexatória, desumana ou degradante. Parágrafo único. Consideram-se, dentre outras, formas de revista vexatória, desumana ou degradante: I – desnudamento parcial ou total; II – qualquer conduta que implique a introdução de objetos nas cavidades corporais da pessoa revistada; III – uso de cães ou animais farejadores, ainda que treinados para esse fim; IV – agachamento ou saltos. Art. 3º. O acesso de gestantes ou pessoas com qualquer limitação física impeditiva da utilização de recursos tecnológicos aos estabelecimentos prisionais será assegurado pelas autoridades administrativas, observado o disposto nesta Resolução. Art. 4º. A revista pessoal em crianças e adolescentes deve ser precedida de autorização expressa de seu representante legal e somente será realizada na presença deste”; Ademais disso, no mesmo julgado e no mesmo voto referido, foram invocados precedentes da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (caso 10.506), que dizem respeito a “revisões vaginais rotineiras das mulheres que visitam a Unidade 1 do Serviço Penitenciário Federal” na Argentina. Nas suas conclusões e tomando aqui de empréstimo a citação feita pelo Desembargador Diógenes Hassan Ribeiro, a Comissão anotou o que segue: “93. Contudo, a Comissão deseja salientar que este caso representa um aspecto íntimo especial da vida privada de uma mulher e que o procedimento em questão, seja a sua aplicação justificável ou não, pode provocar angústia e vergonha profunda em quase todas as pessoas ao mesmo submetidas. Ademais, a aplicação do procedimento a uma menina de 13 anos pode resultar em grave dano psicológico, difícil de avaliar. A Senhora X e sua filha tinham direito ao respeito de sua intimidade, dignidade e honra ao procurarem exercer o direito à família, apesar de um dos seus membros estar detido. Tais direitos só deveriam ter sido limitados no caso de uma situação muito grave e em circunstâncias muito específicas e, nesse caso, com o estrito cumprimento, pelas autoridades, das regras anteriormente definidas para garantir a legalidade da prática”; À vista do sumariamente exposto o que se pretende aqui controverter é se a normativa referida e o precedente da Comissão Interamericana desautorizam qualquer modalidade de revista íntima em estabelecimentos prisionais no Brasil ou se exceções são admissíveis; Note-se que o precedente da Comissão não afasta a possibilidade da revista em determinadas circunstâncias (em caráter excepcional), mas refere-se a revistas gerais realizadas indiscriminadamente sem fundamento concreto em uma suspeita determinada e motivada por razões de segurança e necessidade, devendo observar os critérios da razoabilidade e proporcionalidade (a Comissão refere os dois critérios). Além disso, cuidava-se, no caso submetido à Comissão, de revista íntima realizada em menina de 13 anos, dependente da decisão adotada (no sentido de consentir com a intrusão) pela sua representante legal que a acompanhava na ocasião. Em síntese conclusiva, a Comissão estabeleceu que a) a legitimidade de uma inspeção vaginal deve ser absolutamente necessária para alcançar o objetivo legítimo no caso específico; b) não deve existir nenhuma medida alternativa; c) em princípio deve ser autorizada por mandado judicial e d) deve ser realizada por profissionais da saúde; O problema que aqui se coloca é, portanto, o de avaliar, com base na articulação necessária (e devida) dos parâmetros do sistema internacional (em especial do Interamericano) de Direitos Humanos e mediante uma interpretação sistemática da ordem jurídico-constitucional interna brasileira não apenas se a revista íntima em especial em pessoas do sexo feminino pode ser realizada e, caso afirmativa a resposta, em que circunstâncias; Antes de avançar, calha sublinhar que de acordo com reiterada jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça a revista íntima para impedir o ingresso de entorpecentes e outros objetos que possam colocar em risco a segurança é constitucionalmente legítima; Como é curial — e a própria Convenção Americana de Direitos Humanos assim como a Comissão e a Corte Interamericana assim o reconhecem — que mesmo os direitos à intimidade e privacidade, bem como os direitos à honra e à integridade física e psíquica não tem caráter absoluto, resta saber quando uma revista íntima estará ultrapassando os parâmetros de uma restrição legítima de direitos e importando em sua violação, em especial se não estará sendo também violada a própria dignidade da pessoa humana, em se configurando a figura do tratamento desumano ou degradante; Para o STJ tal não será o caso (ao menos é o que desponta do julgado colacionado) quando se tratar de verificar (a partir de fundada suspeita a partir de elementos concretos) da identificação e retirada de entorpecentes para coibir o tráfico de drogas nos estabelecimentos prisionais, não se cuidando de revista genérica ou mesmo aleatória e justificada por fins constitucionalmente legítimos; Da mesma forma, entende o STJ que não existe constrangimento ilegítimo que possa configurar violação da dignidade humana quando a revista é realizada por agentes femininos e é a própria revistada que retira, sem intervenção de terceiros, os objetos de sua cavidade vaginal. Além disso, quanto a necessidade de se utilizar outros meios menos invasivos (em respeito aos critérios da proporcionalidade) quando a fundada suspeita decorre precisamente da passagem por scanner e/ou detector de metais, a revista íntima (ainda mais quando não realizada por terceiros) estaria respeitando tanto os parâmetros supranacionais quanto o marco normativo interno; É de se acrescentar, todavia, que a o precedente do STJ deveria pelo menos — em se adotando entendimento favorável à realização excepcional e respeitados os limites estabelecidos na decisão — ser complementado no que diz com os requisitos para a aferição da legitimidade das revistas íntimas. Em especial há de ser consignado que no caso de recusa da mulher em concordar com a revista e retirar ela própria eventual objeto de sua cavidade vaginal — a retirada por terceiros deveria então ser submetida ao crivo da autoridade judicial e realizada por profissionais da saúde, tal como determinado pela Comissão Interamericana). http://www.conjur.com.br/2017-out-06/direitos-fundamentais-legitimidade-constitucional-revistas-intimas-presidios?utm_source=dlvr.it&utm_medium=facebook