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Investimento não declarado no exterior não caracteriza evasão de divisas - 12/07/2019
Investimento não declarado no exterior não caracteriza evasão de divisas (Em recente decisão, o STJ, ao analisar o REsp 774.523-SP, entendeu que a não declaração do Banco Central de investimento em um fundo no exterior caracteriza a conduta de evasão de divisas, pois considerou que a manutenção das cotas corresponde a “depósito” e, com isso, preenchido estaria o tipo penal capitulado no artigo 22, parágrafo único, parte final da Lei 7.492/86. O entendimento da 5ª Turma foi de que o termo “depósito” deve ser ampliado e, com isso não limitado à manutenção de dinheiro em casas bancárias no exterior, mas, sim, qualquer tipo de disponibilidade de recursos, como no caso de aplicações em fundos de investimento; Ainda, foi utilizado como fundamento que a simples falta de declaração à Receita Federal caracterizaria, em tese, o crime de evasão de divisas; O caso analisado pelo STJ é de singular importância, podendo ser considerado o leading case nos tribunais superiores. A temática foi pouco ou quase nada analisada pelo Judiciário, pois, ao que se tem conhecimento, os brasileiros que detêm ativos no exterior o fazem mediante a participação societária em empresas estrangeiras, procedendo a declaração das participações tanto à autoridade monetária como fiscal e, com isso, evitando qualquer tipo de questionamento; O delito de evasão de divisas, disposto no artigo 22 da Lei 7.492/86, introduziu no Direito Penal brasileiro a possibilidade de punição das condutas resultantes da saída irregular de divisas do país ou ausência de declaração de depósitos mantidos no exterior; Por essa razão, a norma tipifica três hipóteses: a primeira corresponde à operação de câmbio sem autorização do BC que objetiva promover a evasão de divisas tutelando, assim, as reservas cambiais do país. De outro turno, o previsto na segunda parte do caput (remeter divisa para o exterior sem autorização legal) e, ao final do parágrafo único, a tutela penal recai sobre o Fisco, na medida em que a saída de moeda ou divisa para o exterior ou a manutenção de depósitos não declarados à repartição federal acabam por lesá-lo. O artigo 22, portanto, não tutela apenas o Sistema Financeiro Nacional, mas também a proteção da ordem tributária. Todavia, isso não permite afirmar que a falta de declaração ao BC caracterizaria o crime de evasão de divinas, mas, sim, outro tipo penal, a sonegação fiscal; O dever de informação das disponibilidades mantidas por brasileiros no exterior existe no ordenamento jurídico pátrio desde 1962, quando a Lei 4.131/62 previu que as pessoas físicas e jurídicas domiciliadas no Brasil teriam de apresentar declaração à extinta Superintendência da Moeda e do Crédito sobre os bens e valores que possuíam no exterior; A partir da edição da Circular 2.911/2001, o BC passou anualmente a editar norma onde estabelece os prazos e limites para que os brasileiros, pessoas físicas ou jurídicas, detentores de ativos no exterior apresentem suas declarações anuais; Importante destacar que a principal razão pela qual o BC exige a declaração é a de verificar a expectativa do retorno dos capitais para o Brasil, diretriz básica da política cambial brasileira. Ainda, o contribuinte que mantém recursos no exterior tem a obrigação de prestar a Declaração de Ajuste Anual do Imposto de Renda à Receita. Com isso, existem duas declarações distintas: uma ao BC, para permitir o controle cambial, e outra à Receita, para apuração de imposto a pagar; No caso da decisão do STF, tem relevo a análise da questão da evasão de divisas, pois, para o tipo previsto no artigo 22 da Lei 7.492/86, o bem a ser protegido é exclusivamente o controle de operações cambiais, pois a remessa de dinheiro para o exterior, com a intenção de ocultar a sua origem criminosa, passou a ser tratada pela Lei 9.613/98 (crimes de lavagem de dinheiro e ocultação de patrimônio); Com isso, a lei de evasão de divisas busca coibir a saída de valores para o exterior, e por isso que expressamente menciona que será caracterizado o crime pelo depósito não declarado à autoridade competente, no caso o BC, e nunca a Receita; O descumprimento da declaração ao BC, portanto, implicaria em penalidades administrativas (a MP 2.224/01 definiu a infração como punível com multa pecuniária), e não o crime de sonegação fiscal (contra a ordem tributária), tipificado na Lei 8.137/90, sendo que o agente somente cometerá o crime contra o Sistema Financeiro Nacional do artigo 22 da Lei 7.492/86 se deixar de declarar depósitos, o que não parece ser o caso da falta de declaração de cotas de fundo de investimento; Essa distinção ocorre em função dos distintos bens jurídicos tutelados pelas normas penais. Essa modalidade de “evasão de divisas” não existe para proteger a ordem tributária (patrimônio fiscal), mas apenas, em termos gerais, a política cambial brasileira (equilíbrio e controle das reservas cambiais); Para uma melhor compreensão da diferença entre “depósito” e “aplicação em fundos” (o termo mais correto é investimento em cotas de fundo de investimento), há necessidade de se socorrer das definições do Direito Econômico e Financeiro; O Direito do Mercado de Capitais define fundos de investimento como um veículo de aplicação financeira, resultado da união de múltiplos investidores, com o objetivo de realizar um investimento financeiro para obter um objetivo ou retorno esperado, sem personalidade jurídica. No Brasil, desde o início dos primeiros fundos na década de 1960, a forma determinada para a constituição do fundo foi a contratual em condomínio. Portanto, são aplicadas as regras gerais dos condomínios do artigo 1.315 do Código Civil. Com isso, a liquidez imediata (disponibilidade dinheiro) de um fundo de investimento é muito pequena, na maioria dos casos somente possível quando do encerramento do fundo; No mundo existem outras formas para a formação de fundos, sendo que nas Ilhas Cayman (território onde estava o fundo tratado na decisão do STJ), são constituídos de maneira contratual de sociedades. Então, naquele país, quem investe em fundo é dele sócio, o que fragiliza a alegação de liquidez do investimento; Por sua vez, o “depósito”, nos termos da Lei 7.492/86, representa a operação bancária em que os recursos são depositados, por prazo indeterminado, para livre movimentação pelo titular, sem nenhum tipo de remuneração pelo banco. Assim, o banco depositário fica obrigado a restituir o mesmo valor que recebeu, tão logo quando solicitado pelo depositante ou a sua ordem (liquidez imediata). Para os bancos, a principal finalidade de receber os depósitos é ter fomento para operações de crédito. Depreende-se, portanto, que os investimentos em fundo e os depósitos têm funções completamente distintas e, em até certo ponto, antagônicas, pois um visa obtenção de lucro, e o outro, mera guarda de valores; O próprio BC em suas circulares faz a expressa distinção entre o depósito e as outras formas de bens e valores no exterior, sendo que, quando da edição da norma que determina a declaração de bens no exterior, lista as hipótese de ativos que devem ser declarados, destacando, de maneira inequívoca, o “depósito no exterior” dos demais ativos; Portanto, parece ser claro que depósito é uma das categorias dos bens que precisam ser declarados ao BC, mas a manutenção de um investimento em fundos, caso não declarado, não comporta o entendimento de caracterização de evasão de divisas. A ampliação do conceito de depósito para outros bens violaria o princípio da reserva legal, o que constitucionalmente é defeso, pois a interpretação deve ser benéfica ao imputado, e não o contrário (proibição de analogia in malam partem); Com isso, a decisão do STJ traz preocupação, pois o fundamento do entendimento é que a falta de declaração à Receita já seria o suficiente para caracterizar o crime de evasão de divisas, quando em verdade, em razão dos distintos bens jurídicos tutelados pelas normas penais, a modalidade de “evasão de divisas” não existe para proteger a ordem tributária, mas, sim, a política cambial brasileira) https://www.conjur.com.br/2019-jul-11/opiniao-investimento-fundo-nao-caracteriza-evasao-divisas?utm_source=dlvr.it&utm_medium=facebook