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Farsa probatória - leitura dos depoimentos e sua confirmação - 20/06/2018
Farsa probatória - leitura dos depoimentos e sua confirmação (REFERÊNCIA JURISPRUDENCIAL: HC 183.696/ES, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 14/02/2012, DJe 27/02/2012. Ementa do julgado: PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. ROUBO. AUDIÊNCIA DE TESTEMUNHAS DE ACUSAÇÃO. (1) ART. 212 DO CPP. ORDEM DAS PERGUNTAS. MAGISTRADO QUE PERGUNTA PRIMEIRO. NULIDADE RELATIVA. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE PREJUÍZO. ILEGALIDADE. NÃO RECONHECIMENTO (RESSALVA DE ENTENDIMENTO DA RELATORA). (2) COLHEITA DE DEPOIMENTO. LEITURA DAS DECLARAÇÕES PRESTADAS PERANTE A AUTORIDADE POLICIAL. RATIFICAÇÃO. NULIDADE. RECONHECIMENTO. 1. O entendimento que prevaleceu nesta Corte é de que, invertida a ordem de perguntas, na colheita de prova testemunhal (CPP, Art. 212, redação conferida pela Lei n. 11.690/2008), tem-se caso de nulidade relativa, a depender de demonstração de prejuízo - o que não se apontou. Ressalva de entendimento da Relatora. 2. A produção da prova testemunhal é complexa, envolvendo não só o fornecimento do relato, oral, mas, também, o filtro de credibilidade das informações apresentadas. Assim, não se mostra lícita a mera leitura pelo magistrado das declarações prestadas na fase inquisitória, para que a testemunha, em seguida, ratifique-a. 3. Ordem concedida para para anular a ação penal a partir da audiência de testemunhas de acusação, a fim de que seja refeita a colheita da prova testemunhal, mediante a regular realização das oitivas, com a efetiva tomada de depoimento, sem a mera reiteração das declarações prestadas perante a autoridade policial; E.R.S. foi denunciado pela prática do crime previsto no artigo 157, caput, do Código Penal. Em audiência de instrução e julgamento, o MM. Juiz singular, além de ignorar a disposição do artigo 212 do Código de Processo Penal, iniciando a inquirição das testemunhas no lugar das partes, leu os depoimentos prestados na fase inquisitorial e perguntou aos depoentes se ratificavam seus teores. O defensor suscitou questão de ordem, a qual foi negada. Em suas alegações finais, o Defensor requereu a nulidade da audiência de instrução, com a seguinte fundamentação: MM. Juiz, antes de iniciar a inquirição das testemunhas esse defensor manifestou a contrariedade pela forma como Vossa Excelência costuma proceder. De fato. A anterior leitura das declarações prestadas na esfera policial à testemunha e ao ofendido é uma afronta à ampla defesa. Ao adotar este procedimento, inviabiliza que a defesa se atenha às contradições das testemunhas. Tal procedimento mina a espontaneidade dos depoimentos e viola claramente o princípio da audiência bilateral. Como disse o desembargador Relator Alemer Ferraz Moulin em seu voto na apelação 021.080.106.321 "Tal conduta não representa a melhor técnica a ser adotada". Assim, a defesa entende que a leitura dos depoimentos prestados no IP para ulterior ratificação das testemunhas representa clara quebra da necessária espontaneidade dessas, o que afronta o postulado do contraditório, razão pela qual, requeiro a nulidade dos depoimentos colhidos na data de hoje; O Juiz singular não acolheu a preliminar arguida, afirmando que: Sustenta, também, preliminarmente, ter havido violação ao princípio do contraditório e ao disposto no artigo 203 do Código de Processo Penal, pelo fato de as testemunhas, quando inquiridas em juízo, terem se reportado às declarações prestadas em sede policial que lhes foram lidas por este Juízo. A alegação da defesa, que encontra respaldo em certa doutrina, está fundada na lógica de que o inquérito policial, por tratar-se de peça meramente informativa destinada à formação do convencimento da acusação, não deveria sequer acompanhar a inicial acusatória, pela razão de estar fundado em um procedimento administrativo que, ao menos em tese, não seria regido pelo contraditório. A crítica volta-se contra o fato de as inquirições das testemunhas terem sido realizadas com base nas declarações por elas prestadas em sede policial, visto que naquela ocasião, em razão do princípio inquisitivo que vige na fase inquisitorial, não houve espaço para ciência e oportunidade de reação do acusado. É oportuno registrar que a inquirição, das testemunhas foi feita em juízo, ocasião em que, frise-se, estava presente o defensor do acusado, conforme se depreende da termo de assentada juntado às fls. 77/78 e 101 dos autos. Fixadas essas premissas, é de se concluir que o expediente adotado não violou o princípio constitucional do contraditório, já que, embora as testemunhas tenham se reportado e confirmado depoimento anterior, o fizeram na presença do defensor do acusado, a quem foi reservado não só o direito de proceder aos questionamentos que julgasse necessários, mas também de reagir contra o que se mostrasse inconveniente aos interesses do seu cliente. Isto posto, não há que se falar em violação do princípio do contraditório, já que à defesa, por ocasião da inquirição das testemunhas arroladas pela acusação, foi garantida a ciência plena do conteúdo dos depoimentos e, ainda, a oportunidade de se manifestar sobre eles mediante as arguições que entendesse oportunas, conforme evidenciam os termos de fls. 77/78 e 101. Corroborando este entendimento, já foi decidido: (fls. 171-173); Contra a sentença, foi interposta apelação criminal ao Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, onde se requereu fosse declarada a nulidade da audiência de instrução, recurso que foi desprovido: Sustenta a defesa, outrossim, violação ao artigo 203 do Código de Processo Penal, porque as testemunhas de acusação, quando inquiridas em Juízo, apenas reportaram-se às declarações prestadas na esfera policial, lidas pelo Magistrado que presidia a audiência. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, todavia, consolidou o entendimento segundo o qual a ratificação, perante a autoridade judicial, sob o crivo do contraditório, dos depoimentos prestados na fase inquisitória, por si só, não acarreta a nulidade do julgamento, mormente quando à defesa técnica fora concedida a oportunidade de reformular as perguntas às testemunhas, no interesse do acusado (termo de fls. 78/79); Após, foi impetrado habeas corpus ao Superior Tribunal de Justiça, que foi distribuído à Sexta Turma, a qual, por maioria concedeu a ordem de habeas corpus para anular a oitiva das testemunhas, determinando que outra fosse realizada, sem a mera ratificação dos depoimentos prestados no inquérito policial; A Ministra Maria Thereza consignou que, muito embora existissem precedentes permitindo a prática do ato, seria hora de repensar a temática, inclusive porque o Supremo Tribunal Federal teria proferido decisão na qual reconheceu o erro em tal forma de proceder, só não tendo anulado o ato porque o defensor não teria arguido a questão; Como constatou a Ministra, o artigo 203 do Código de Processo Penal disciplina a forma como a prova testemunhal deve ingressar ao processo (relatar o que souber, explicando sempre as razões de sua ciência ou as circunstâncias pelas quais possa avaliar sua credibilidade). Face ao artigo, a Ministra consignou em seu voto que: Deste comando, retiram-se, em especial duas diretrizes. A primeira, ligada ao relato, que será oral, como reforça a regra do Art. 204 (O depoimento será prestado oralmente, não sendo permitido à testemunha trazê-lo por escrito ). A segunda, refere-se ao filtro de fidedignidade. Tal peculiaridade, relativa ao modo pelo qual a prova ingressa nos autos, a meu sentir, é a que foi maculada pelo modo como empreendida a instrução, in casu. O depoimento, efetuado em sede policial, é chancelado como judicial, com uma simples confirmação. Não há como se aferir, penso, credibilidade desta maneira. E, mais, com a singela providência de ratificação, estar-se-á a enfraquecer a norma do Art. 204 do CPP; Assim, foi concedida a ordem “para anular ação penal a fim de que seja refeita a colheita da prova testemunhal, mediante a regular realização das oitivas, com a efetiva tomada de depoimento, sem a mera reiteração das declarações prestadas perante a autoridade policial”; Como bem ressalta ROSA em sua obra baseada na teoria dos jogos, existem muitas formas de realizar um doping processual. Uma das mais corriqueiras é a leitura dos depoimentos prestados na fase inquisitorial e a solicitação de sua ratificação ou a confirmação de seu conteúdo e assinatura. Raríssimas exceções, não se vê a testemunha afirmar ao juízo que o que consta do depoimento seja mentira ou que a assinatura não seja de sua autoria; ROSA nomeia a prática de jogo de memória, uma tentativa de esquentar depoimentos frios: A testemunha/informante não é convocada para participar de um jogo rápido de memória, ou seja, não se pode ler a denúncia e/ou o depoimento prestado na fase preliminar e depois perguntar-se o que ela sabe do caso. Isso é doping, jogo sujo, embora realizado na maioria dos foros. Evidentemente que a testemunha, mormente quando policial, deve ser situada no tempo e no espaço da ocorrência, eventualmente com os parceiros da ação, mas jamais nos detalhes que transformam seu depoimento num espetáculo da sugestão. Assim é que se o jogador quiser ler a denúncia ou depoimento, nos termos do artigo 212, do Código de Processo Penal, a sugestão é manifesta e deve ser impugnada.[1]; Quando se requer à testemunha que corrobore ou ratifique o seu depoimento prestado na fase inquisitorial, está se ignorando o contraditório e o direito ao confronto pelas partes. Além disso, ignora-se as disposições do Código de Processo Penal e, consequentemente, o devido processo legal. Isso porque, à despeito da decisão ter feito referência tão somente ao artigo 203, há ofensa a outros; Vejamos os dispositivos aplicáveis: Art. 203. A testemunha fará, sob palavra de honra, a promessa de dizer a verdade do que souber e Ihe for perguntado, devendo declarar seu nome, sua idade, seu estado e sua residência, sua profissão, lugar onde exerce sua atividade, se é parente, e em que grau, de alguma das partes, ou quais suas relações com qualquer delas, e RELATAR O QUE SOUBER, explicando sempre as razões de sua ciência ou as circunstâncias pelas quais possa avaliar-se de sua credibilidade. Art. 204. O depoimento será prestado oralmente, NÃO SENDO PERMITIDO À TESTEMUNHA TRAZÊ-LO POR ESCRITO. Art. 212. As perguntas serão formuladas pelas partes diretamente à testemunha, não ADMITINDO O JUIZ AQUELAS QUE PUDEREM INDUZIR A RESPOSTA, não tiverem relação com a causa ou importarem na repetição de outra já respondida; Como bem destacado pela Ministra, com relação ao artigo 203, a testemunha deve depor sobre o que souber. Caso não saiba nada sobre os fatos ou não se lembre, não se pode requentar os depoimentos do inquérito. Não há credibilidade em tal "prova"; Quanto ao artigo 204, bem destacam PACELLI e FISCHER que o legislador procurou evitar uma "programação do depoimento", impedindo sua tomada espontânea. Deve-se impedir uma memória prévia de sua narrativa. Ou seja, quando a testemunha lê "depoimento" prestado anteriormente, impede-se que as partes possam explorar as diversas nuances da situação fática. Ignora-se a necessária espontaneidade do depoimento, o qual deve ser sujeito de falsificação; Já o artigo 212 é inequívoco quanto à perguntas que possam induzir a resposta. Quando se pergunta a testemunha se ela corrobora o que foi dito na fase inquisitorial já se sabe da resposta, como bem aponta ROSA, "os agentes sabem o que é preciso dizer para corroborar os depoimentos pela prática e, para qualquer pergunta além do que está dito, soltam um “não me recordo/lembro, são muitas ocorrências... faz tempo". Quando se lê o conteúdo do inquérito se está antecipando a resposta e sugerindo (induzindo) a versão correta; Outrossim, já vimos que depoimentos prestados ante órgãos policiais e que não tenham sido submetidos ao contraditório são considerados hearsay evidence. Como esperar o devido contraditório de uma ratificação?; Tem-se, então, que o pedido de ratificação do depoimento prestado no inquérito policial é uma farsa probatória que deve ser plenamente rechaçada vez que ignora princípios processuais e disposições legais) http://www.salacriminal.com/home/farsa-probatoria-leitura-dos-depoimentos-e-sua-confirmacao