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A noção de paraquedas dourado deve ser inserida nas delações premiadas - 14/06/2018
A noção de paraquedas dourado deve ser inserida nas delações premiadas (É preciso (re)pensar a natureza jurídica da delação premiada, pois não se pode confundir a colaboração com os benefícios ou procedimentos dela decorrentes. Aparentemente, a maior parte da doutrina entende que a delação premiada tem natureza jurídica de meio de obtenção de prova[5]. O STF, a um só tempo, entende que a delação premiada é negócio jurídico e meio de obtenção de prova.[6]; Por não ocorrer com a necessária participação dialética das partes, é que o artigo 155 do CPP estabelece que é defeso ao juiz fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos. Não por outra razão, o parágrafo 16 do artigo 3º da Lei 12.850/2013 traz regramento semelhante. E isso porque um decreto condenatório depende de provas mais extensas e robustas[7] produzidos em contraditório judicial; A delação em si, vista em um espaço hermeticamente fechado, desprovida da oxigenação do contraditório e da ampla defesa, não é prova. Ocorre que também não pode ser considerada como mero meio de obtê-la, sob pena de ser comparada a uma simples notitia criminis delatada aos órgãos investigativos. A proposta de colaboração premiada já deve carrear os elementos informativos suficientes para “capturar” a mentalidade do órgão acusatório, em troca dos benefícios legais permitidos. Trata-se, pois, de uma regra da corroboração.[8]; Nessa quadra, como elemento informativo que é, ao juiz, é defeso fundamentar a sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação (artigo 155 do CPP), muito menos condenar com fundamento apenas nas declarações de agente colaborador (parágrafo 16 do artigo 3º da Lei 12.850/2013); Assim, a colaboração premiada é o resultado de uma negociação levada a efeito pelo delegado de polícia ou pelo Ministério Público e o colaborador, sempre acompanhado do seu defensor, que será materializada em uma proposta. Observadas essas balizas, a colaboração premiada, antes da sua homologação, é um procedimento de caráter extraprocessual. E, como tal, presentes as partes, a negociação, a proposta, a regularidade, a voluntariedade e a legalidade, entende-se, então, tratar-se de um negócio jurídico.[9]; Depois de homologada, a delação passa a ostentar a natureza de negócio jurídico processual personalíssimo. E, por ser personalíssimo, o STF não permite que o terceiro, referido pelo delator, impugne os termos da colaboração premiada, salvo se o vício da homologação da colaboração se der com violação das regras de prerrogativa de foro previstas na Constituição Federal.[10]; Daí se entender que a natureza jurídica da colaboração premiada é de negócio jurídico penal, que depende de uma relação pré-contratual pautada pelo princípio da confiança, sigilo e boa-fé, levantamento das propostas efetuadas pelas partes, assinatura do termo, homologação e o consequente cumprimento do acordo. Embora se trate de contrato penal personalíssimo, pode gerar efeitos (responsabilidade penal) em relação a terceiros, uma vez que constitui exceção legalmente prevista.[11]; Ocorre que nem sempre os termos do acordo traduzem a exata vontade das partes. É no momento da homologação judicial, que o negócio jurídico realizado entre o agente colaborador e o agente estatal passa do plano da simples existência para o plano da validade. Como negócio jurídico de natureza penal que é, a colaboração premiada firmada pelo agente colaborador, de um lado e, do outro, pelo Ministério Público, não se perfaz com a manifestação de vontade de apenas essas partes. É o juiz que, depois de homologado, poderá trazer o acordo para o plano da eficácia no momento da sentença; Assim, de uma simples proposta de acordo bilateral (colaborador e órgão ministerial), após a homologação, passa-se para um negócio jurídico plurilateral, existente e válido, com a presença do juiz que estará apto a conceder os benefícios propostos pelo Ministério Público, se cumpridas as promessas feitas pelo colaborador; Como bem ressalta Streck, os direitos fundamentais possuem uma dupla faceta de proteção. Assim, se a faceta negativa diz respeito à proteção contra abusos dos poderes estatais, a faceta positiva impõe que a jurisdição constitucional efetive, de fato, uma proteção positiva, “estando os juízes e tribunais obrigados, por meio da aplicação, interpretação e integração, a outorgar às normas de direitos fundamentais a maior eficácia possível no âmbito do sistema jurídico”[12], sempre em conformidade com os direitos fundamentais; Se os direitos e garantias fundamentais devem ser aplicados não apenas em sentença, mas durante todo o processo, não deveria haver restrição desses direitos e garantias na fase investigatória, tendo como fundamento tão somente os elementos informativos trazidos pelo colaborador, circunstância que vem ocorrendo com certa frequência; Trata-se da quebra das garantias com base em uma colaboração premiada por prospecção, onde, invertendo a lógica do processo penal acusatório, o magistrado decreta a prisão “para que o investigado não venha a cometer determinado delito”, agindo de forma vidente, ao invés de decretar a prisão “para impedir que o investigado continue a cometer determinado delito”, com base nas evidências existentes. Ou pior, a colaboração premiada de prospecção pode ocorrer na malfadada lógica de que “o passarinho pra cantar precisa estar preso”[13], onde são decretadas prisões preventivas projetando-se uma esperança de que o agente preso delate o modus operandi da suposta organização criminosa; O processo penal é (deveria ser) um instrumento de retrospecção (e não de previsão), ou seja, é o instrumento necessário para se tentar reconstruir processualmente um fato já ocorrido no passado, e não um procedimento judicial para se prever todas e quaisquer atividades criminosas futuras[14]. Se se considerar a colaboração premiada como meio de obtenção de prova, com supressão de direitos fundamentais, estar-se-ia utilizando-se o processo penal como o malfadado procedimento de fishing expedition[15], transformando-o em um Big Brother, para buscar toda e qualquer prova com base única e exclusivamente nos elementos informativos apresentados pelo delator; Portanto, se fragiliza o argumento de que a colaboração é “meio de”. Ora, se para a decretação da prisão é necessário a prova da existência do crime e do indício suficiente de autoria, não se sustenta essa medida de restrição da liberdade com base unicamente em um “meio de se obter prova” que, logicamente, ainda não foi obtida tão somente com a colaboração do delator; Em meio às incertezas desse novel instituto, pode ocorrer de uma das partes se sentir prejudicada ou simplesmente opte (direito subjetivo) por rescindir o acordo. Há ainda a possibilidade de que os elementos informativos inicialmente prometidos não sejam devidamente cumpridos pelo delator. Enfim, questões internas ou externas ao processo podem levar à rescisão do negócio jurídico processual personalíssimo; No âmbito do processo penal, se se pode falar em partes vulneráveis na relação contratual, essa parte seria o agente colaborador. E isso porque o agente detém as informações, porem é o órgão ministerial o titular da ação penal, que poderá oferecer os benefícios legais pelas informações conquistadas; Assim, o Ministério Público tem o poder demasiadamente ampliado e a discricionariedade de não efetuar um acordo de delação, ainda que o delator tenha esse direito. Afinal, pode ocorrer de o órgão de acusação estar em negociação simultânea com outros delatores e, na busca do melhor interesse da investigação, favorecer um em detrimento do outro, por motivos e mediante práticas que a jurisdição não alcança, e que sejam questionáveis em razão dos limites e da qualificação dessa atuação.[16] Nesse caso, a delação premiada unilateral, talvez, seja a cláusula dourada de maior proteção às partes, pois trata-se de mecanismo de controle de poder e de eventuais abusos na negativa de oferecimento do acordo; A delação premiada unilateral é a concessão, em sentença, dos benefícios previstos no artigo 4.º da Lei de Organizações Criminosas, independentemente da prévia homologação do contrato penal qualificado, desde que da colaboração advenha um ou mais resultados dos incisos I a V, do mesmo artigo.[17]; Por isso, é preciso que se estabeleçam cláusulas de proteção, que funcionariam como um paraquedas dourado, nos casos de realização e rescisão do contrato penal celebrado. A própria lei de organização criminosa já estabelece uma cláusula de golden parachute quando determina que, no caso de retratação da proposta, as provas autoincriminatórias não poderão ser utilizadas exclusivamente em desfavor do agente colaborador; Ocorre que somente essa garantia, desconsiderada a índole de um processo penal democrático, é insuficiente para dar total cumprimento aos princípios do nemo tenetur se detegere, presunção de inocência, legalidade, boa-fé e lealdade processual; É certo que, conforme o parágrafo 10 do artigo 4º da Lei 12.850/13, as partes poderão se retratar da proposta inicialmente feita a qualquer tempo. Todavia, após a homologação do acordo transacional, a esfera de liberdade das partes é limitada aos seus termos. Desse modo, qualquer intenção unilateral sobre o não cumprimento do acordo homologado não possui qualquer efeito prático sem que antes haja a devida rescisão mediante o mesmo juízo que proferiu a decisão homologatória; Nos termos do artigo 849 do Código Civil, a transação só se anula por dolo, coação, ou erro essencial quanto à pessoa ou coisa controversa. Ao passo que o seu parágrafo único estabelece que a transação não se anula por erro de direito a respeito das questões que foram objeto de controvérsia entre as partes; Em função disso, faz-se necessário pensar em institutos civilistas para serem aplicados na colaboração premiada. No Direito Civil, esse acordo só poderia ser rescindido mediante ação anulatória.[18] No processo penal, a simples manifestação de vontade da uma das partes não pode ser suficiente para a rescisão do acordo firmado; É dizer, não pode haver uma rescisão unilateral do acordo após a homologação. Trata-se, portanto, de mais uma cláusula que assegura um paraquedas dourado para se evitar abuso de qualquer das partes, sempre considerando a ordem de chegada de colaboração, a efetividade da contribuição e o esclarecimento dos fatos) https://www.conjur.com.br/2018-jun-01/nocao-paraquedas-dourado-inserida-delacoes?utm_source=dlvr.it&utm_medium=facebook